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terça-feira, 10 de setembro de 2013

A CHAPA, O ABISMO E A COLHER






A primeira conversa do dia (ao levar minha filha para a escola, ela vai muda:) é com Serginho, o chapeiro especialista em baguete com casquinha, no balcão da padaria. O tema geralmente é futebol. Daí, ao me ver entretido com uma leitura, perguntou-me se eu estava lendo sobre o São Paulo “dele”. Provoquei o torcedor do outrora glorioso dizendo que não me interessava por temas que eu não podia mudar. Estava agarrado mesmo com um relatório sobre as desigualdades entre “as condições de saúde materno-infantil entre os países”. Com cara interrogativa e na iminência da baguete torrar, Serginho me perguntou: E dá para mudar isto?

O relatório “A Brecha Assassina”, elaborado pela World Vision (Visão Mundial) tem a clara finalidade: Mostrar aonde as crianças seguem morrendo sem necessidade (19.000 por dia, de causas evitáveis/tratáveis!) e como reverter este quadro. Para isto, o relatório sai dos tradicionais rankings de medição nacional (aqueles o campeão é sempre a Suécia ou a Finlândia) e mapeia o fosso intranacional, isto é, a desigualdade interna nos indicadores de saúde infantil entre os pobres e ricos, dentro de cada país, segundo 4 indicadores:
  1. Expectativa de Vida: Esta medição mostra as atuais desigualdades na expectativa de vida entre grupos de pessoas e diferentes áreas de um país, incluindo mortes neonatais e de menores de cinco anos.
  2. Custo de Pessoal por Uso de Serviços de Saúde: Medido através de um indivíduo faz pagamentos do próprio bolso para cuidados de saúde.
  3. Taxa de Fertilidade (Adolescentes): Evidências mostram a correlação entre sobrevivência e idade da mãe (ligada à renda, escolaridade e condições físicas). Logo, a taxa de fertilidade na adolescência é uma representação da capacidade de grupo de população para sustentar seus filhos.
  4.  Cobertura dos Serviços de Saúde: Medido pelo número de médicos, enfermeiros e parteiras por 10.000 pessoas em um país. A evidência mostra que os países com menos de 23 médicos/enfermeiros/Parteiras por 10.000 pessoas são incapazes de chegar a toda a população com serviços essenciais de saúde de forma adequada. Medico cubano conta na estatística :-)
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A primeira constatação de quem lê o sintético relatório é que a brecha é um abismo. Além do idioma que falarão uma criança nascida na Franca e outra no Chade não têm nenhum destino comum. Já sabíamos pelos relatórios tradicionais que a africana terá quase 280 vezes mais chance de morrer, antes de completar os 5 anos de idade, do que a francesa. Já era ruim? O Relatório da WV mostra que a criança pobre chadiana tem quase 1800 vezes mais chances de morrer, antes de completar 5 anos que uma criança de classe média francesa.

A segunda constatação é que dinheiro não é tudo. Vários países ricos têm brechas internas de saúde mais altas do que países de renda média ou mesmo baixa. Itália, Coreia do Sul não estão sequer entre os 20 menos desiguais para crianças. EUA quase está fora dos 50 melhores. Todos perdem para Cuba, Bielorrússia, Uruguai e Tonga. Nota do Autor: Não sei esta “Tonga” não é a mesma da Tonga da Mironga do Kabuletê kkk

Mas, o abismo não para aí, embora não demonstre o relatório, há ainda as diferenças subnacionais, as determinadas pela geografia na qual a criança nasce. Crianças pobres de regiões remotas são ainda mias prejudicadas do que as de regiões urbanas, mesmo quando têm faixa de renda equivalente.  São as desigualdades sobrepostas: renda, idade da mãe, região e etnia. Dentro de países altamente desiguais, como Brasil, África do Sul e Filipinas, uma criança nascida de mãe extremamente pobre, jovem e de minoria étnica tem em média 13 vezes mais chance de morrer antes dos 5 anos do que outra, de uma mãe branca de classe média da capital. Menos do que os mais de 150 vezes de há 20 anos, mas ainda feio.

Por ter seu foco na faixa da mortalidade infantil (abaixo de 60 meses), o relatório também não aponta para as desigualdades de mortalidade até o final da adolescência. As geradas por “causas externas”, principalmente a violência. Se este dado lá estivesse, veríamos que um menino pobre negro brasileiro que vence as probabilidades contrárias e sobrevive, terá 21 vezes mais chances de ser assassinado antes dos 18 anos.

Eis o abismo. E a colher? Bem, a colher é a que eu, você, o Serginho e todos nós temos nas mãos para tapar este abismo. Esta colher carrega somente um voto, uma voz, uma rede de relações, uma ação, uma coalizão. Enfim, nesta colher cabem uma disposição, um compromisso e uma ação. Desprezível? O próprio relatório aponta que não.  
Para tapa-lo, ou ao menos diminui-lo, é necessário entender o que provoca o abismo.  E o relatório mostra que alguns aspectos que, se resolvidos, poderiam tapar, em um intervalo de 10 anos, mais de metade deste abismo. Pouco? Isto já representaria, nas atuais taxas de natalidade, salvar mais de 3.000.000 de crianças por ano. Alguns dos fatores listados no relatório, sobre os quais o Serginho tem poder de influência, são:
  1. Aumento do investimento (público e privado, aquele que vem do orçamento familiar) nos primeiros anos de vida, que é o período com o maior potencial de proporcionar boas condições de saúde para a vida.
  2.  Políticas e práticas e estabeleçam infraestrutura, serviços e trabalhadores de saúde (Médicos/Enfermeiros/etc.) presentem em áreas urbanas periféricas e rurais.
  3. Condições de trabalho que respeitem os direitos e a condição feminina, já que a saúde e condições de trabalho da mulher estão associadas diretamente a sobrevivência e saúde da criança.
  4. Seguridade social inclusiva: Em todo o mundo, 4 em cada 5 pessoas não têm o apoio de cobertura social básica. Este item, no qual o Brasil está entre os 20 melhores do mundo, contribui para uma melhor saúde, incluindo menor mortalidade.
  5. Comportamentos sociais que: privilegiem a criança, pratiquem e disseminem igualdade.


De colher em colher, esta brecha, construída, pode ser revertida. 

Já quanto ao São Paulo do Serginho... Bem, neste caso melhor uma pá, para ele cavar um buraco e se esconder de vergonha até o time melhorar. 

O relatório pode ser encontrado em:



domingo, 4 de agosto de 2013

IDHM: DETALHES TÃO PEQUENOS DE NÓS 195 MILHOES, A PERGUNTA QUE IMPORTA & A MÃE.


Dizem que ando meio impaciente. Impaciente é sua avó! :-) OK. Admito uma leve inquietação com alguns temas, como matérias e discussões em época de lançamento de relatórios de pesquisas, como o Censo e o Índice do Desenvolvimento Humano, o IDH. E, não passa um mês sem algum destes relatórios. Nesta semana, saiu o estudo sobre o IDH Municipal, o IDHM.

Eu tento ficar na minha. Mas, o povo insiste em comentar o IDH como uma tabela do campeonato brasileiro. É a mania por rankings. Subiu! Desceu!Passamos a Argentina? Tudo parece orbitar a velha questão se “o meu é maior do que o seu”.

Para me acalmar conto até 10, fora de ordem. Difícil, diante da preguiça expressa nos textos. E as informações muito relevantes? Tipo: Conceição do Lago-Açu (MA) tem renda per capita 20 vezes inferior a de Águas de São Pedro (SP).  E pensar que eu vivia sem saber disso? A mãe do jornalista mora em Conceição do Lago-Açu? :-)

Cansativo ler que a Veja vai destacar que nós não passamos nem o Uruguai e que a Carta Capital dirá “que nunca antes na história deste país” subimos 34 posições. Ambas as afirmações completamente irrelevantes.

O IDHM é filho do IDH. Assim como o pai, combina três dimensões[1]: Saúde; Educação e Renda. Mas, é diferente do pai. Tem adaptações metodológicas profundas na área de Educação com ênfase ao “investimento” (foco na população adolescente e jovem) e ainda se utiliza parâmetros de renda mais precisos. Para que os indicadores possam ser combinados em um índice único, eles são transformados em índices parciais, cujos valores variam entre 0 e 1, sendo que quanto mais próximo de 1 mais alto será o nível de Desenvolvimento Humano. Os dados do IDHM vêm do Censo de 2010. Como é distinta, não se pode, portanto comparar o IDHM2011 com as medições feitas pelas metodologias anteriores. Por isto também foram “remedidos” os IDHMs 1991 e 2000. Isto gerou um panorama completo e espacialmente referenciado. Até municípios que não existiam em 1990 podem saber qual era o IDHM do seu atual território, antes da divisão.

Alguns “poréns” são armadilhas para os apressados e picaretas.

O primeiro é que o IDH (que dá base ao IDHM) não foi feito para ser medido por município. Mesmo com as competentes adaptações feitas pelo IPEA, não funciona bem em unidades territoriais muito pequenas e interligadas abertamente. Em português claro, o IDH de um município contamina o outro. E os municípios são unidades altamente permeáveis. Isto inviabiliza uma análise isolada, listas de top 10 e outras preguiças mentais.

Segundo, o IDHM trata de unidades muito díspares: os municípios. Daí, não se podem tirar grandes conclusões de pérolas como: “43,5% dos municípios possui longevidade superior à média nacional”. Neste tipo de agregação, Borá (805 habitantes) e São Paulo (11,3 milhões) entram como UMA unidade. É estatística que só serve para fazer gráfico colorido, bonito de postar, depois da foto do macarrão que você fez e acha que alguém está interessado. Aposto que o jornalista maníaco por ranking faria um brilhante comentário tipo: “YUMMY! Também quero”.1,2,4,7...

Terceiro é que, quando estou quase calmo, abro o jornal e me deparo com “especialistas em tudo” de plantão a compararem o IDHM com IDHs nacionais. Ex. São Caetano do Sul tem IDHM maior do que a Espanha. Cacimbas tem IDHM menor do que Moçambique. Cacimba! As metodologias de medição são incomparáveis. É mais ou menos como comparar estes jornalistas e especialistas com gente que saiba do que está falando. 1,2,8,3...

DETALHES TÃO PEQUENOS DE NÓS 188 MILHOES.
Não estou cuspindo no índice que tanto comi. Bom lembrar que o “Atlas de Desenvolvimento Humano”, que traz também o IDHM, é uma excelente base comparativa dos quase 6000 municípios brasileiros. São 180 indicadores. Para quem quer se debruçar sobre os dados, há muita informação. Mas, precisam ser correlacionadas com outras, inclusive com um mínimo conhecimento sobre o que se passa nestes municípios.

Embora o IDHM não seja uma medida significativa no varejo, é riquíssimo quando examinado no atacado. Analisar municípios por grupos, entender as diferenças entre cidades limítrofes. Evoluções atípicas, etc. Estes dados geram perguntas. E já disse Guimarães: “Deus é traiçoeiro! Ele faz é na lei do mansinho”. O IDHM só faz sentido se examinado nos detalhes que seu conjunto revelam, nos movimentos.

Se você tem síndrome de Odete Roitman e acha que “este país tupiniquim nuca muda”, pare o texto por aqui e volte para as frases falsas da Clarice Lispector no Facebook ou ainda vá ver se alguma das Quatro Pontes (PR) partiu. Os dados são inequívocos: o país mudou e muito, em 20 anos. A classificação do IDHM médio (o que mostra o todo) foi de Muito Baixo (0,493, em 1991) para Alto Desenvolvimento Humano (0,727 em 2010). Houve (e seguirá havendo) evolução nas 3 dimensões do índice. Isto costuma acontecer porque elas são ligadas por fios correlativos. Mais educação, mais saúde, mais renda. Mais renda, mais saúde e educação. Coloque na ordem que quiser. As dimensões se alimentam mutuamente, mesmo que não simultaneamente.  Daí, em séries temporais longas, exceto quando há causas externas extemporâneas (guerras, epidemias, campeonato mundial do Corinthians, etc.), veremos que elas evoluem abraçadinhas.

A outra constatação do conjunto é que o país continua espacialmente muito desigual. O PNUD fez um mapa em cores para que até jornalista entendesse. (Obs.: Já reparou porque nestes gráficos Verde ou Azul é sempre bom e Vermelho ruim? Será que a maioria dos analistas é palmeirense e gremista?). O Centro-Oeste “enricou”, as diferenças diminuíram no conjunto. Mas, ainda são enormes entre o Norte e Nordeste e as demais regiões.

O detalhe é que há a desigualdade dos desiguais. A desigualdade média é maior dentro dos municípios com pior IDHM. Se o IDHM de um município com grande desigualdade é baixo, então os pobres deste município estão ainda em pior situação do que os pobres em municípios menos desiguais. Mesmo que isto afete proporcionalmente uma pequena parte da população (6%), porque ocorre basicamente em municípios pequenos (menos de 10 000 hab.), é neste grupo de 11 milhões de pessoas que estão 7 em cada 10 miseráveis do país. Logo, entender e reverter o problema nestes pequenos municípios é chave para erradicar a miséria.

As mudanças mais significativas (observadas em toda a análise) IDHM 2010 são:

1.     Saúde (medida pela esperança de vida ao nascer): Neste índice, o Brasil conseguiu chegar ao desenvolvimento muito alto. A cada ano, os brasileiros vivem mais, em todo o País. Nenhuma cidade está na faixa "baixo" ou "muito baixo". A maioria dos brasileiros (62,2% da população) vive em áreas com o IDHM-Longevidade considerado “Muito Alto”. A diminuição significativa da mortalidade infantil (com grande participação da sociedade) e a queda na fecundidade são as principais causas do avanço neste índice.

a.     A maioria absoluta das pessoas vive em cidades que baixaram para menos de 19 por mil nascidos vivos a mortalidade infantil. Antecipando a meta (ODM) para 2015.

b.     Hoje, mais de 50% dos municípios brasileiros têm taxas de fecundidade abaixo do nível de reposição da população. Isto ajuda a longevidade, mas já apresenta uma preocupação: envelhecimento da população em idade ativa. Um viés estrutural do IDH (da qual o IDHM não consegue escapar de todo) é que ele termina por privilegiar populações maduras. Além desta vantagem natural do índice, no Brasil os idosos são mais ricos do que as crianças em uma medida de 3 para 1.Logo, principalmente no Sul, há muitos municípios que apresentam um alto IDHM justamente por serem “velhos”. E estes municípios tendem a cada vez menores. Daí, seu excelente resultado não significa muita coisa, exceto como tema das partidas de dominó na praça.

c.     O avanço só não é ainda maior por uma razão: a violência, que se espalhou das grandes metrópoles para as cidades pequenas e atinge especialmente nos jovens. O crescimento na expectativa de vida nos últimos dez anos – 46% no Brasil e 58% no Nordeste – seria até 1.8 ano maior se não fosse o impacto da violência entre os jovens. A taxa de mortes violentas entre jovens chegou a 134 por 100 mil hab., mais do que o dobro do já alto índice da população em geral, de 54 por 100 mil.

2.     Educação é a dimensão que mais avançou em termos em termos relativos: 128,3%. Mas ainda é a única área do IDHM que não se pode classificar como ALTA. Não compare com outros países, lembre-se de que a metodologia brasileira é mais exigente (tem foco nos últimos anos de cada nível de ensino e não nos primeiros, como o IDH tradicional). Em 20 anos o Brasil universalizou o ensino fundamental, triplicou a inserção na secundária e quase dobrou a no ensino superior.

a.     No ensino fundamental o crescimento alcançou estabilidade, mostrando que os resultados na universalização do ensino alcançaram maturidade. É o tal “se piora estraga”. É preciso manter as taxas. Porém, devido ao curto tempo, o Brasil só universalizou o ensino fundamental há 15 anos (o Uruguai o fez há 73 anos, a África do Sul há 31), ainda haverá impacto da educação na renda, nos próximos anos. Educação é um índice que melhora rapidamente, mas demora mais para impactar os outros.

b.     O índice da secundária foi o que cresceu mais na última década, puxado pelo fluxo escolar de jovens 2,5 vezes maior em 2010, em relação a 1991. Um crescimento de 156%.

c.     Todos os comentários que li mencionam que devemos contrapor este avanço na escolaridade (o que o IDHM mede) com o problema da qualidade. Besteira. Não que a qualidade da educação (seja isto o que for: resultado em exames, horas de escola/ano, etc.) não seja relevante para o país. Porém, não o é para a avaliação do IDHM.  O IDHM tem que ser comparado endogenamente, ie, consigo mesmo.  Acompanhe a ideia: A desigualdade entre o indivíduo A (que tem o curso completo da faculdade de 1ª. linha) e outro, B (com 3 anos de escola) é X.  Suponhamos que B agora tem 8 anos de escola. A desigualdade e agora é de Y. Mesmo que a escola de B seja ruim e a de A tenha piorado, assim mesmo Y será MENOR do que X.  A desigualdade educacional é enorme, mas a evolução na escolaridade em si (mesmo a de baixa qualidade) representa impacto na renda, saúde e redução do fosso. A questão da qualidade educacional precisa de outros elementos de análises. Deve ser medida nos impactos extraescolares do ensino, tais como produtividade, satisfação, patentes, etc. O IDHM mede a matéria-prima, a qualidade deve ser medida pelo produto final que gera a educaçao.

d.     Com o aumento geral dos níveis de escolaridade, cai o corelação ano Escolaridade X Renda. Quanto mais gente na escola, menos a escola é uma diferença competitiva para obter maiores salários.  Nas grandes cidades mais ricas, esta relação caiu quase 1/3 em 20 anos. A escolaridade perde peso na redução efetiva das desigualdades. Daí, outras barreiras de desigualdade ganham mais importância (escola privada X pública, idiomas, etc.).

3.     Renda: A melhoria corresponde a um ganho de renda per capita de R$ 346,31 em 20 anos.

a.     Renda evoluiu equilibradamente pela queda da desigualdade e pelo aumento da renda de trabalho. Uma boa notícia que mostra potencial para que a renda continue a crescer.

b.     A desigualdade de renda brasileira transparece no IDHM. Norte e Nordeste têm, neste índice a maior brecha em relação às demais regiões. Mesmo sem crescimento econômico, mantidas as taxas atuais de desemprego e renda de trabalho, se conseguir reduzir a desigualdade de renda (GINI) para a média latino-americana, o Brasil já adicionaria outros R$101,70 de renda a cada família brasileira, em 2020 e teria erradicado a miséria. Noutras palavras, a desigualdade ainda é principal causa de pobreza no Brasil.

c.     Municípios com renda menor têm mais crianças e adolescentes proporcionalmente. As políticas específicas para as famílias aonde vivem estas crianças e adolescentes ainda não tiveram os impactos necessários.

d.     Municípios com renda menor tendem a se dividir mais. Nos últimos 20 anos, 68% das emancipações deram-se em áreas deprimidas em termos de renda. Mesmo tão criticadas pelo senso comum, o curioso é que as emancipações têm, em 83% dos casos, efeitos positivos no índice (aumento maior do que a média da microrregião) do território emancipado.
 
A PERGUNTA QUE IMPORTA...

 Algo muito central passa despercebido nestes relatórios. IDH não mede o Desenvolvimento Humano. Não apenas porque o Desenvolvimento é mais amplo do que estas dimensões (inclui participação, interação, liberdades, etc.). A ideia do IDH não é medir o Desenvolvimento, mas o POTENCIAL para tal.

A hipótese que baseia o IDH é que se um indivíduo tem saúde, renda para as suas necessidades e conhecimento (educação) terá mais opções, uma gama de escolhas ampliadas na vida. Enfim, poderá se desenvolver.

No entanto, o aumento do IDHM acompanhados de fenômenos aparentemente contraditórios (como aumento das violências principalmente dirigidas a jovens e mulheres, monetarização da vida, privatização de serviços essenciais, decadência nos indicadores ambientais, aumento do endividamento de curto-prazo, segregação espacial urbana, e outros) pode indicar uma sociedade que, a despeito de suas crescentes possibilidades (potencial para o Desenvolvimento), faz escolhas que terminam por fazerem mal e prejudicar as atuais e futuras gerações.

Assim, é natural e desejável a busca por melhorar os índices que compõe o IDHM. Mas, a pergunta principal diante do índice não é “Quanto?”, mas “E daí”?

A questão central passa a ser: “Em que medida as possibilidades ampliadas de escolha geram melhoria da vida da sociedade como um todo?”. E se esta medida não é adequada, “o que se deve fazer para informar melhores escolhas pessoais e coletivas?”. Isto não é uma pergunta puramente de políticas de Estado. É uma pergunta sobre a construção do tecido social. Uma sociedade com poucos espaços comuns, precários canais de diálogo, que não compartilha serviços, recursos e decisões terá dificuldades de construir identidades consistentes e de fazer boas escolhas. “A socialização pelo consumo é monológica, voluntária e não obrigatória, individual e não coletiva”.  Mesmo em países de altíssimo IDH, e que tiveram ainda crescimento nos últimos anos, sua população crê que sua vida está pior do que antes. Somente 28% dos Alemães pensa que seu país é melhor hoje do que há 20 anos. No Canadá este grupo não passa dos 35%.

Não basta para uma sociedade ficar mais rica, mais escolarizada e mais longeva, ela precisa ser uma sociedade melhor para todos os seus participantes atuais e futuros.

Ainda acha mais importante medir se o seu é maior do que o da Argentina? Vá ver o tamanho do IDHM de Pontão (RS)*! :-):-)

 *0,725

 
Mais sobre o IDHM 2010 em:












 



[1] Saúde (medida pela esperança de vida ao nascer); Educação (% de 18 anos ou mais com ensino fundamental completo; % de 5 a 6 anos frequentando a escola + % de 11 a 13 anos frequentando os anos finais do ensino fundamental + 15 a 17 anos com ensino fundamental completo + % de 18 a 20 anos com ensino médio completo) e; Renda (medida pela renda real mensal, em agosto de 2010)

segunda-feira, 16 de abril de 2012

O MUNDO QUER SABER SE VOCÊ ESTÁ FELIZ



A busca pelo graal de um índice que reflita o estado de bem-estar integral já conta com mais 40 anos de história. Inicialmente desprezada como poesia pelos economistas, o tema ganhou terreno nesta última década e invadiu departamentos sisudos como os da Universidade de Chicago, Yale e Berlin. Mais recentemente, chegou até aos Bancos Privados (Ex: Banco Itaú, que criou e mede o Índice Itaú de Bem-estar Social) e Grandes Corporações (BP).

Um dos motivos que impulsionou o tema foi o divórcio (se é que um dia foram casados:->) entre a trinca de indicadores clássicos (riqueza, escolaridade e longevidade) de outros como: desigualdade, paz social, suicídios, poupança/esperança, etc. Nos manuais de Economia, tudo viria em um pacote só. Tipo combo do McDonald’s. Ficou rico, leva a batatinha, quer dizer, a paz de brinde. Mas, para surpresa dos economistas (PS: Justiça seja feita aos maridos traídos, na verdade são os Economistas os últimos a saberem das coisas:->) países estão ficando mais ricos educados e longevos e; ao mesmo tempo, a vida (ou a percepção dela) piora. Até o monitoramento do progresso das Metas do Milênio mostra que mesmo países que avançam significativamente nas Metas não experimentam necessária correlação deste avanço com indicadores de qualidade de vida, nem as medidas, nem as percebidas.

Daí, é um quase consenso hoje o tal “Paradoxo do Crescimento”, um nome científico complexo para o que minha avó dizia: “menino, o dinheiro não traz felicidade”.

Até um índice de Felicidade Interna Bruta foi criado e produziu aumento de programas de televisão sobre o bucólico Butão, campeão global do índice, mesmo que nem se deem conta da sua existência. Alias, talvez por isto sejam felizes, porque não se preocupam com indicadores.

A despeito da fragilidade metodológica destas tentativas, é certo de que o mundo precisa de medidas mais antropocêntricas para olhar no espelho. Desenvolvimento bom é o que muda positivamente a vida da maioria das pessoas. Porém que ninguém seja Poliana. A onda dos índices de felicidade tem uma agenda política e mesmo comercial por detrás. Uma das indústrias de crescimento mais surpreendente, durante o atual período de crise econômica e austeridade tem sido "indústria da felicidade". Felicidade passou a ser objeto de trabalho crescente de economistas e matemáticos (e não filósofos ou cantores de axé somente) que estudam o que constitui a felicidade e fazer recomendações aos governos sobre como melhor para aumentá-la.

Não podemos desprezar o fato de que tais índices ganham a agenda pública dos ex-ricos do Norte justamente quando a crise econômica mais os atinge. Em meio a um aumento substancial da miséria, em uma época de baixa reputação dos magos das finanças, quando parecem faltar respostas não-convencionais a problemas históricos (o fato de que a riqueza do Norte foi alavancada no pós-guerra com base em exploração de matérias-primas + mão de obra baratas em outros países, aliados a pesados endividamentos em moedas autoproclamadas fortes), surgem economistas vetustos criando um novo conjunto de indicadores para debate.

A indústria do índice de felicidade tem conseguido recentemente um auge com a publicação mega-divulgada do primeiro Relatório Mundial Felicidade. Encomendado por uma Conferência das Nações Unidas sobre Felicidade, sob os auspícios da Assembleia Geral da ONU, que traz o imprimatur da Universidade de Columbia (Earth Institute) e é editada pelo seu diretor, Jeffrey Sachs (economista pop star, ex-liberal, convertido ao credo do Desenvolvimento) e por dois especialistas em felicidade (seja lá o que isto signifique), Richard Layard (London School of Economics) e John Helliwell (Universidade de British Columbia). O relatório conclui que o mundo é mais feliz no norte da Europa (Dinamarca, Noruega, Finlândia, Países Baixos) e mais infeliz na África (Togo, Benin, República Centro Africano, e Serra Leoa). Além de contrariar os que acham que é necessário sol e praia para ser feliz, o relatório traz poucas novidades nos resultados. Mas, é a primeira tentativa econométrica robusta de constituir um índice destes (o Índice Bruto de Felicidade é legal, mas é mais poesia do que medição).

Se ainda não sabemos como medir ao certo a felicidade, um grupo já está feliz ganhando recursos públicos e privados para tentar medi-la. O governo dos EUA convidou peritos, incluindo Daniel Kahneman (psicólogo, Nobel de Economia) para elaborar medidas de "bem-estar subjetivo". Mantendo sua tradição, os EUA são o último grande país a embarcar nesta canoa. O governo francês começou a publicar sua própria felicidade indicador em 2009. O Gabinete Nacional de Estatística da Grã-Bretanha tem um programa para medir o bem-estar nacional, há 5 anos. A OCDE já elabora diretrizes para os seus membros produzirem um "banco de dados de bem-estar". O Brasil já incluiu, em algumas pesquisas do IBGE, a percepção de segurança e esperança.

Os pesquisadores dividem os sentimentos das pessoas em "felicidade afetiva" (humores diários) e "felicidade avaliativa" (avaliação global que uma pessoa faz de sua vida). Eles construíram indicadores que buscam a felicidade a partir de diferentes pontos de vista, usando perguntas como "Quão feliz você estava ontem?" (Reino Unido); "Todas as coisas considerado, quão satisfeito você está com sua vida como um todo hoje em dia? "(IRS Europeu) e" Tomando em consideração todas as coisas, você diria que é: muito feliz, muito feliz, não muito feliz ou nada feliz "(World Values Survey)?

Eu me pergunto quem responde a um questionário destes? Se eu fosse perguntado, logo responderia com uma contraproducente pergunta: Defina “satisfeito”. Logo, o entrevistador seria um exemplo claro de pessoa infeliz se a mim viesse entrevistar. Mesmo que os demais entrevistadores seja menos chato do que eu, as suas respostas diferem muito. Isto estimula ainda mais a nascente “ciência da felicidade”. Os autores do Relatório de Felicidade Mundial argumentam que a felicidade pode ser medida objetivamente, mesmo que difira sistematicamente através das sociedades e ao longo do tempo. Por fim, partem do pressuposto de que a felicidade tem causas previsíveis e que, mesmo não de maneira linear, está correlacionada com coisas específicas (tais como a riqueza, a distribuição de renda, saúde e instituições políticas). Logo, portanto, deve ser possível para o governo a criar as condições adequadas para a felicidade a florescer.

Por mais desejável e necessário que seja olhar o bem-estar, os críticos destes índices argumentam que além da dificuldade técnica, trazer a felicidade para a agenda pública é dar ao Governo é responsável por sua felicidade. E a agenda da felicidade também chegou (ou está a caminho) ao marco jurídico de vários países. O Direito a ser feliz já foi aprovado pelo Senado brasileiro e está presente em leis de países como Japão, México e Suécia.

Por isto, o que lhe faz feliz já não é mais tema de propaganda de supermercado nem chaveco para a balada. Você está feliz com isto?



quarta-feira, 21 de setembro de 2011

RÉGUA MASCULINA: RELATÓRIO DESENVOLVIMENTO 2012


Com mais eventos do que lançamento de novela, o Banco Mundial prepara a divulgação do seu Relatório de Desenvolvimento 2012””. A maratona iniciou-se nesta semana com seminários on-line, conferências de imprensa com especialistas de todo o mundo e uma reunião na sede da ONU, que contou com participação do "animado" Ban-Kin-Moon (receita para os insones, gravem o secretário geral da ONU falando. Ninguém resiste 5 minutos acordado), de atrizes (inclusive Angelina Jolie, que deve ter aproveitado para encomendar ao 1º Ministro cambojano uma dúzia mais de órfãos kkk) e de chefes de governo (Dilma não foi porque teve que se reunir com o Obama e recusar a sua oferta para comprar o Texas. Não seria uma má idéia, comparmos o Texas e trocamos com a Família Sarney, pelo Maranhão kkk)

“Ficando Quites” (Getting to Equal) seria uma tradução apropriada, para a edição deste ano, focada em um dos temas que mais tem desafiado à eficácia das políticas sociais: Gênero.

O relatório, que será liberado somente na próxima semana, traz inovações ao mesclar dados estatísticos (que só meia dúzia de chatos com eu, lê até o final) com uma extensa pesquisa de opinião que perguntou a mais de 20000 mulheres em 108 países: O que é ser igual?

Curioso é que a coleta tradicional de dados sobre gênero não segue no mesmo sentido das respostas. Os dados que tradicionalmente usamos para definir igualdade entre os gêneros são oriundos de uma visão simplista, masculina para usar um termo provocativo. A visão das mulheres sobre igualdade não se foca (embora inclua) na equiparação de renda, matrículas escolares ou posição em postos públicos/privados. A pesquisa mostra que igualdade é mais definida mais como “liberdade para ser diferente”.

Com os dados que temos, podemos afirmar que a última década assistiu em todo o mundo uma redução (em alguns casos até superação) da brecha de gênero na escolaridade, renda e poder (singelamente definido aqui como ocupação de postos de mando). O Relatório 2012, por exemplo, mostra que a África já entrou na tendência mundial de redução da brecha, que a Ásia reduz a brecha de renda em ritmo acelerado e que a América Latina, depois de um período tímido (1960-1980) caminha para encontrar os patamares médios dos países desenvolvidos, em 2030. O relatório também mostra que nos países desenvolvidos a brecha (menor) reduz mais lentamente, e até estagnou-se em alguns países. Sinal claro de que a equidade de gênero, definida com base renda/escolaridade/poder encontrou um “núcleo duro”. Aquele conjunto de fatores causais complexos e que as políticas sociais tradicionais não altera.

A despeito do avanço, as entrevistas revelam que as mulheres percebem sua situação de maneira menos otimista do que os dados. Relatos de violências de todos os tipos e origens, opressão social, preconceito no acesso a serviços públicos, cargas horárias excessivas, desprezo pela especificidade, etc. Surpresa para alguns será perceber que a visão das mulheres dos países considerados mais iguais não difere tanto de outras. Um sinal evidente de que quanto mais igualdade formal, mais conflituosa e explícita se revela a desigualdade social.

Para ir além da medição tradicional da equidade é necessário tomar a palavra das mulheres como norte. Indicador de gênero não é sinônimo de desagregar dados pela categoria “feminino/masculino”. Como medir a equidade em termos de possibilidades de escolha? Este é o desafio dos novos indicadores de gênero.

Como em toda a discussão de desigualdade, o problema não reside no grupo ao qual chamamos de desigual, mas no que consideramos incluídos. Não se trata de estender uma igualdade masculina às mulheres. Para perceber a desigualdade é necessário assumir a diferença.

Não se trata de medir a igualdade nos termos de condições de oprimir. A visão atual de medição é baseada na pressuposição de que existe um só parâmetro de desenvolvimento, uma régua (masculina) somente e a tarefa seria medir em que posição dela determinado grupo está.


O Relatório de Desenvolvimento Mundial 2012 é mais um indício de que torta é a régua.



sexta-feira, 27 de maio de 2011

A Poesia e Porta de Saída do Bolsa-Família


O conselho para os alunos é sempre o mesmo: Dados são como poesia, não importa a intenção de quem os coletou e sim com o significado para quem os lê.

Alexandre Leichsenring demonstra que tomou o conselho a sério e honra a tradição de fugir ao óbvio, tomar conclusão como dado ou copiar "press release". Em um trabalho apresentado nesta semana (baseado em Desenvolvimento Local e Combate à Pobreza , IME, 2010), ele inverteu a ordem como os dados do Bolsa-Família vinha sendo lidos. Recorrentemente as pesquisas enfatizam que a maioria dos beneficiários trabalha para complementar o benefício; que a taxa de ocupação entre beneficiários é até maior do que entre não beneficiários com as mesmas condicionantes, etc. Já se sabia que o BF não é um desestímulo ao trabalho, que até contribui para o aumento do salário médio, etc. Este tipo de leitura reforça que o BF é um complemento a salários que não cobrem o essencial (um tipo de subsídio aos patrões e seus salários baixos) e que, a despeito de discursos preconceituosos, não estimula o ócio.

Mas Ale, lendo a poesia dos dados, fez outra pergunta: quantos beneficiários do BF realmente dependem dele para viver? Em outras palavras, quem está mais perto de conseguir suprir o básico mínimo para seus filhos, sem o auxílio do programa? Descobriu que 88% dos beneficiados nunca tiveram rendimento proveniente do mercado formal de trabalho (2004 e 2007). Embora a imprensa tenha replicado a manchete de que "88% das famílias não têm outra renda", a pesquisa de Alexandre diz outra coisa:  88% dos beneficiários dependem do BF. Nota 10 para o Ale, Zero para os jornalistas que leram a matéria com sua habitual lente preguiçosa (curioso é que a preguiça empre leva ao mesmo tipo de interpretação, a do dono do veículo) rsrsrs

Dos 51,4 milhões de pessoas (16-64 anos) e 64 anos registradas no Cadastro Único (cuja sigla estamos proibidos de usar por este se tratar de um blog-família:->) do BF, 6,4 milhões, o que representa 12%, apresentaram renda além do benefício pago pelo governo federal.

A pergunta de Leichsenring aponta para a política social, enquanto a leitura dos dados tradicionais analisa a política assistencial. As críticas ao BF vêm de dois lados: os que dizem que é uma bolsa-vagabundagem (coisa que qualquer um minimamente alfabetizado em dados saberia que não é verdade) e dos que dizem que o BF causa dependência. Estes últimos confudem. Programas como o BF há até em países ricos e destinam-se a garantir um direito: sobreviver. O BF é um programa asistencial.  O próprio governo caiu, vez por outra, no discurso que o BF seria política social. O estudo do Ale mostra que não é. O Brasil tem um parco e ineficaz programa social, ie, conjunto de  ações coordenadas para gerar o desenvolvimento. A necessidade de um imenso reforço e melhoria no programa social não implica em reduzir o BF e a área assistencial. Ambos conjuntos de políticas são necessárias. Sobreviver é um direito, assim como poder incrementar renda, escolaridade e demais condições de vida. O desenvolvimento seria a tal "porta de saída" que os dados de Ale mostram não estarem abertas para 88% dos beneficiários.

Os motivos para a tal porta de saída ( que é desejável, mas não obrigatória) estar trancada são explorados no trabalho de Alexandre. Aqui ele não encontou nenhuma novidade (porque talvez não haja mesmo). Para gerarem renda estavelmente e em níveis que tornem o BF desnecessário, haveria que se incrementar a escolaridade (quase 75% dos tem menos do que o ensino fundamental), melhorar condições de saúde, disponibilizar infra-estrutura de creches e a acessibilidade (principalmente dos transportes públicos). Destrancar as portas de saída para uma política que reduza a demanda de assistência não é uma tarefa fácil, mas as chaves já são conhecidas.









quarta-feira, 11 de maio de 2011

MUITOS NUMEROS, UM DESAFIO (ou porque 16 = 25 = 5)


O grupo de música clássica dos anos 80, Blitz já cantava “Tá tudo muito bem, tá tudo muito bom, Mas eu realmente... “

As principais conclusões do Censo 2010 já tinham sido antecipadas aqui, no mês passado. Refuto as acusações de ter acesso privilegiado só porque tenho um homônimo presidente do IBGE kkk Nenhum Eduardo tem culpa disto. A culpa é da Estatística. Pelos dados da contagem, lançados há 2 meses, já era possível antecipar boa parte dos resultados preliminares divulgados na semana passada. Afinal, como nossas pesquisas por amostragem (principalmente a PNAD) são bem feitas, logo era de se esperar que não tivéssemos surpresas. Apaixonantes mágicas da estatística que corroboram que as principais matérias-primas de Deus ao fazer o universo foram Matemática e Poesia :-)

De volta ao Censo, comecemos pelo assunto do momento: Miséria, Extrema Pobreza, Perrengue, etc. Quando as estatísticas eram tão assustadoras que só revelavam que não poderíamos mudar a situação, acostumamo-nos a olhar percentuais e fitar neles para nossos desafios. Perdido de um, perdido de 10.

Mas, a situação mudou. A dinâmica populacional e melhoria socioeconômica brasileira tornaram o quadro mais definido, nas últimas duas décadas. Como um tempero de salada que parado, começa a revelar claramente seus ingredientes. Paradoxalmente, quanto menor, mais os grupos vulneráveis tornam-se visíveis. E para ver os ingredientes é preciso ir além dos percentuais.

Assim, precisamos atentar para os números absolutos que nos desafiam. Todos já viram nas manchetes: “16.000.000 de pessoas estão abaixo da linha da extrema pobreza (miséria)”. Vamos ao que a imprensa não conta porque tem preguiça de escrever e você preguiça de ler:

1. O IBGE contou 11.430.465 pessoas com renda entre R$1,00 e R$70,00. De onde vêm os 16 milhões?

2. O Censo também contou outras pessoas que declararam renda ZERO, 4.836.732.

3. Você pode pensar: É gente que quer esconder o que tem. Alguém no IBGE é tão espero quanto você, e para evitar isto aplicou um filtro. Assim, só contam os que declararam renda ZERO e moravam em domicílios sem água, esgoto, banheiro ou sem energia elétrica e tinham pelo menos um morador com +de 15 anos analfabeto e sem moradores acima de 65 anos. Em resumo, gente realmente pobre, embora saibamos que a renda ZERO não existe. Somados aos do item#1, temos os 16.267.197 pessoas extremamente pobres. O número das manchetes. Mas, se fosse para ficar nas manchetes teria sido jornalista rsrsrs.

4. Estes 16.267.197 são os que vivem em “domicílios permanentes”. Isto é, estes são os muito pobres com CEP. E os que não têm? Censo não serve para este tipo de população, mas ela existe. Vários estudos, aplicados às regiões metropolitanas das capitais e às outras 5 maiores cidades em cada estado, estimam o número desta população móvel. Na hipótese mais otimista, há nas condições de extrema precariedade, sem domicílio permanente o equivalente a 0,8% da população estável. Daí, somemos aos 16.267.197 outros 1.518.328. Logo, haveria no Brasil 17.785.525 pessoas com renda inferior a R$70,00 per capita.

5. Mas, estas 17.785.525 têm companhia. São aquelas pessoas que estão na faixa de extrema volatilidade, isto é, sua renda não vem de fontes estáveis, por isto elas podem passar para o outro lado da linha facilmente. Dos 19.738.897 que estão na faixa de pobreza (a quem vem acima da de pobreza, entre R$71,00 e R$140,00), 3.553.001 estão muito próximas à linha de miséria e não têm fontes estáveis. Logo, são miseráveis também. Assim chegamos a 21.338.526 de pessoas extremamente pobres no Brasil.

6. A conta acaba aqui, certo? Errado. Vamos aplicar outro filtro. Regiões. O próprio IBGE mede o preço da cesta básica em vários pontos do país. Daí é possível corrigir o número mágico de R$70. Mas, se R$70 é média já não seria corrigido? Sim, se a distribuição dos pobres acompanhasse a média populacional, mas não acompanha. Algumas regiões mais caras têm proporcionalmente mais pobres do que outras. Logo, nestas regiões precisaríamos elevar a linha de extrema pobreza. Se assim fizermos, outros 1.904.630 extremamente pobres aparecem na nossa contagem. Para ser justo, vamos descontar as regiões onde o custo de vida é menor. Isto retira 299.507 pessoas da lista. Novo número de extremamente pobres: 22.943.649.

7. Além da correção de custo de vida regional, há outra raramente estimada. O custo-criança. Para cada pessoa abaixo dos 15 anos (até 5 por família) o custo de vida sobe em média, 6.5%. A pirâmide etária na faixa dos mais pobres é bem diferente das existentes nas demais faixas (vide grafico, ao fim). Enquanto na ponta dos mais ricos (acima de R$1.120,00 per capita) 7.2 em cada 100 pessoas têm menos de 15 anos; na ponta dos mais pobres, 17.1 estão nesta faixa etária. Usando a média de 3.1 crianças abaixo de 15 anos por domicílio nesta faixa de renda, e corrigindo pelos custos regionais, o novo número de miseráveis seria 25.008.577.

8. Logo havia no Brasil, em Novembro de 2010, mais de 25 milhões de pessoas na extrema pobreza. Destas, 4.276.466 miseraveis tem menos de 15 anos.

9. Ainda na pobreza infantil, some a essas, outras 803.766 crianças que estão na faixa de pobreza imediata, mas não têm família (são sustentadas por não familiares ou estão abrigadas).

10. O principal desafio do país é mudar a vida de 5.080.232 crianças. É um número imoral para a 7ª economia do mundo, como gostamos de nos lembrar.






























terça-feira, 12 de abril de 2011

THE TIDE AND THE BOAT: CONTEXT DEFINITION, GLOBAL POVERTY DYNAMICS AND WORLD VISION MINISTRY.


                                                                                                  by Eduardo Nunes (1)



Where the poor lives is a central question to Development and the key global operational context defining element. It is highly crucial understanding the changes on poverty demographics to foreseen trends and maximizing operations impact.


World Vision knows that and had long time used context analyses to guide its ministry investments. More recently, organizational strategic development built a consensus, perfected technical parameters and brought context definition to the heart of ministerial decisions.






POVERTY AND CONTEXT DEFINITIONS


Among almost uncountable technical possibilities, WV had reached a very simple, used-focused and technically strong two axis context definition: Child Need X Stability . “Contexts are drawn following the definitions of Low, Med, and High physical need and social stability indices ” (2). Over need-stability grade, WV had added overlays, defined by relevant characteristics in restrictive religion (for e.g., Muslims contexts), demographic (urban) and peace disruptions (conflictive environments).


As in WV, other organizations had developed poverty contexts definitions and had applied them to guide polices, investments and eligibility criteria. However, most of them lacks historical comparable series and/or are not available to all countries. Even WV context definition had been measured for few years and yet did not allow historical trend analysis. Among the most historically and geographically comprehensible are two context definition indexes: a) UNDP HDI (low, medium and high human development based on income per capita, education and health criteria in the Human Development Index ) and; b) the World Bank WDI (based on low/middle income classifications -LIC/MIC- combined with fragile and conflict-affected states, FCAS).


Despite “narrower”, the WDI had been longer measured (with the same criteria) and reaches more countries than HDI. Then, WDI is the current most used classification criteria to analyse worldwide long-term parameters changes. It is the reason WDI was chosen here to look over the past two decades poverty dynamics.


World Bank Classifications thresholds (GNI US$ per capita, Atlas methodology)

  

POVERTY DYNAMICS


Mostly of Europe, US, Canada, Japan and, later, South Korea had experienced an almost correlated economic growth with poverty reduction process, in the second half of 20th century. Those countries and their populations, despite inequalities, streamed toward quite to the same direction. The tide of economic growth lifted the poor’s boat.


On the other hand, mostly of the wealth creation experienced in the last two decades (BRIC group, Southeast Asia, Southern Africa and Latin America high dynamic economies), although had decreased the northern-south inequality, had not been strong domestically distributive.


As consequence of “nouveau riche” countries development did not follow the past developed countries parameters observed. This new growing configuration, allied with some inequality increased even in the developed countries, had changed the poverty portrait.


The new development paradigm had already been noted but is clearly demonstrated in a recently published study by International Development Studies on the last 20 years world poverty context dynamics based on the WDI criteria (above).


The study data, combined with age distribution extrapolation , demonstrated that the different parameters in recently development had transformed the global poverty scenario. Most of the world’s poor no longer live in poorest countries. In the past, poverty has been viewed as an LIC+FCAS countries issue predominantly. Nowadays such, a significant number of countries have graduated into the Middle Income (MIC) category, but their population still are poor. As my intention in this paper is not going detailed over the figures, the new portrait of the poverty can be summed up in three points as follows.


1. In 1990, 93% of the world’s poor people lived in LICs. In contrast, in 2008, three-quarters of the world’s poor (approximately 1.3bn) now live in middle-income countries (MICs).


2. About 28% of the world’s poor – about 370mn people live in the remaining 39 low-income countries, which are largely in sub-Saharan Africa. In 1990, they were 93% of the total.


3. About 2/3 of the world’s poor live in stable MICs. This isn’t just about India and China. The percentage of global poverty accounted for by the MICs minus China and India has risen considerably from 7 per cent to 22 per cent. The findings are consistent across monetary, nutritional and multi-dimensional poverty measures.


4. By 2020, based on BRIC’s countries and the 10 most dynamic new regional economies evolution almost 85% of world’s poor will live in MICs.


5. Children poverty had increased, in proportional terms. Despite birth rates decreasing and consequently, in the children coefficient in global population, proportionally children are more affected by poverty than 20 years ago. In 1994, 54 in each 100 poor are bellow 18. In 2009, 57 are children in every 100 poor.


Poverty had changed neighbourhood and is getting a younger face. In other words, countries are escaping from poverty, not mostly of their populations neither their children.


Mostly of the poorest children do not live in poorest countries anymore. This is a massive scenario change with deep implications to World Vision ministry.

Estimates of the change in global distribution of world’s poor (<$1.25/day/day),  1988 versus 2007–8


HETEROGENEITY AND MINISTRY


At a glance, the data presented on the table above could lead to question the definitions of country categories themselves. If the most used poverty measure is not pointing where the poor are, probably we need better indicators. However, the methodological discussion as indexes and indicators are not my focus here.


WV context definition is built over a wider approach than World Bank’s and was not design to be an academic descriptive tool. For WV, beyond categorization criteria, context definition is a key ministry shaping input. WV operation is context shaped. Then, still poverty profile changes do not invalidate context definition; they bring new perspectives on them and raise all sorts of queries about the poverty reduction strategies. Poverty evolution dynamic brings real challenges to the ministry models defined as the most appropriated ones to each context.


The new demographics of wealth confirm that poverty had already become a mostly heterogeneous context problem. The heterogeneity is defined for contexts where the differences among individuals in the same territory become more prominent than the discrepancies observed amongst distinct territories. The heterogeneity does not mean that injustice among rich and poor countries had disappeared, however implies that overcoming poverty face profound in-boundaries constrains.


Contributing to sustainable changes in the well being of the most vulnerable child is now a challenge to be faced, for mostly world’s most children, in a growing heterogeneous contexts scenario.


In this new configuration on poverty distribution, any effective engagement in sustainable solutions to promote child well being could not be seen more as exclusively inter-countries strategy. Global poverty already can be considered as a major complex in-country distributional problem. It is not a matter of global or local. Both, global and local issues, combine in a scaling up complex poverty perpetuation process. Consequently, global issues (Financial Inequalities, Trade inefficiencies and Climate Changes, major provoked by industrialized countries unsustainable way of life) need to be addressed as they impact and are “translated” into the domestic constrains to children life in its fulfilment.


The traditional agenda for fighting poverty, based in traditional north-south resources transfer, was designed for times when poverty was coincidental with the country average income. The traditional agenda was built on social services (mostly education and health) provision and technology/financial resources transfers. It was based in the credo that if healthy, basic educated and well informed people would advance. However, it not happened.


The heterogeneity questions that agenda. It brings all sorts of issues regarding the reasons why people, and mostly their children, are not moving up alongside their countries. For sure, the answers are not the same to all countries, but the most recurrent factors identified are common. Social investments insufficiency aggravated by the actual investments ineffectiveness or misdirection. Broken governance (and government accountability) mechanisms allied with educational and economic opportunities inequalities. Lack of adequate pro-child focused polices. Behavioural-values practices or omissions based hindrances those perpetuated injustices, prejudices and violence. Those elements, past peripheral issues, must be brought to the core of child well being agenda.


It can be affirmed that World Vision is ahead on this debate. Almost 10 years ago, WV had formally recognized a long time practice and declared as essential in poverty fighting mostly of those elements in its Development Framework . Consistently, all around the globe, programmes had struggled to address those gaps.


However, the heterogeneity calls for reinforcement in the organizational capacity to deepen inequality and structural societal transformation programmatic solutions already addressed. Also, it urges increase design and implement new innovative on ground based built solutions. As the lasting child well being impact relies on structural transformation, contribution definition, results measurements and effectiveness dimensions shall reflect that outcome.


Effectiveness well-being promotion in heterogeneous context means contributing to reduce the inequalities those prevent the most vulnerable children to be benefitted of their country economic growth.


Other elements and indicators need to be considered in Ministry strategy guidance. However, there is enough evidence to affirm the growing importance of assessing the Ministry offer and emphasis vis-à-vis the heterogeneity demands. It is necessary keep one eye on the tide, another on the boat, they are not moving together anymore.

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REFERENCES:


  1. Operations & integrated Ministry Director, Latin American & Caribbean Regional Office. The current paper expresses author’s opinions only and is target to WV internal audience. March, 8. 2010.
  2. The initial methodology uses only the cut-off points for Low, Med, and High HDI as a basis for the cut-off points for High, Med, and Low physical need. This was conducted because of absence of similar cut-off points for the %U5UW Children in the official statistics. Since Physical Need index is the combination of the two indices with equal weights, its context lines should come from both indices. Hence in this revised methodology we attempted to include the %U5UW Children in the identification of context lines for physical need. In the initial context lines for FSI, we found that the context line that separates the low and medium social stability was not based on the Foreign Policy Magazine’s definition. An FSI level of 85 was used instead of 90, the FPM’s cut-off point for Alert. Hence we corrected this discrepancy. Though it was noted in the previous methodology that identification of contexts is based on the Low, Med, and High Physical Need and Social Stability classification, the actual delimitation of the contexts didn’t strictly follow this classification at all times. In this revised methodology, contexts are drawn following the definitions of Low, Med, and High physical need and social stability indices. Justifications are provided when there are exceptions (Office of Strategy Management – Global Center. Page 1 of 8, Version 07. 15 February 2008)
  3. Office of Strategy Management – Global Center. Page 1 of 8, Version 07. 15 February 2008.
  4. In contrast, the new UNDP Human Development Report 2010 Multi-dimensional Poverty Index (MPI) of Alkire and Santos (2010) argues that, if you take a multi- dimensional approach (an index of ten indicators of social development) and consider 104 countries that have data (or 78% of the world’s population).
  5. Classification supports Bank’s operational lending categories (civil works preferences, IDA eligibility, etc.) and thus seeks to give better conditions to poorer countries based on economic capacity measured by GNI per capita.
  6. Brazil, India, Russia and India
  7. Global Poverty and the New Bottom Billion: What if Three-Quarters of the World’s Poor Live in Middle-Income Countries? By Andy Sumner, I.D.S., September 2010.
  8. Personal calculations based on UNDATA, Global Population Charts, 2010.
  9. It is noted there just four countries (India, Pakistan, Indonesia, Nigeria) account for almost 60% of the total number of poor that have ‘moved’ to MIC countries. However, cluster analysis reveals no different patterns in poverty moving to MICs.
  10. World State of Children Reports, UNICEF, 2001, 2010.
  11. Andy Sumner, I.D.S., September 2010.
  12. World Vision Transformational Development Policy, April, 2002.

 



 Source: World Bank: http://data.worldbank.org/about/country-classifications/a-short-history