quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

TRACE A LINHA


A presidente Dilma colocou a erradicação da extrema pobreza (miséria, perrengue, fundo do poço, etc...) como sua meta maior de governo. Logo, a segunda maior discussão momento no planalto é: "Quem são estes pobres"."Onde está a linha que os define"?  A primeira é sobre a esposa do vice-presidente, mas isto nao vem ao caso aqui. 

E aqui temos uma questão crucial: como demarcar essa linha de pobreza? Seria o patamar do salário mínimo? O rendimento necessário para o trabalhador cobrir despesas básicas calculado pelo Dieese (R$ 2.227)? O padrão seguido na OCDE (quem recebe menos de 60% da média do rendimento por adulto equivalente de cada país)?

O critério mais usado (dita a lei universal da preguiça: o mais fácil primeiro) é o do Banco Mundial: pobre é quem recebe até US$ 2 por dia (corrigido pelo poder de compra), e miserável é quem recebe US$ 1. Assim, no Brasil, miserável é quem ganha o suficiente para tomar uma lata de coca-cola light por dia, R$2,10 (não seria mais simples, trocar logo o indicador pela coca-light? :-). Este cálculo é per capita. Assim, se uma mulher, a chamemos de Rosa. Se Rosa tem um companheiro desempregado e 3 filhos, sua família estará abaixo da linha de miséria se ela receber menos de R$315,00/mês (10,50/dia0.

Imaginemos que Rosa consiga 240,00 (8,00/dia). Transferindo R$2,51 adicionais, máginca! Rosa não seria mais miserável. A matemática é simples (mesmo que minha filha nao concorde:). Mas a vida não. Nenhuma linha da pobreza medirá de fato todas as dimensões da pobreza. Aumento de renda não vem necessariamente acompanhado de bem-estar. E a mágica estatística de definir uma linha não muda a vida de ninguém. Ou você acha que se Rosa ganhasse R$10,51 ao dia teria uma vida muito distinta se a renda fosse R$10,49?

Como diria Plínio de Arruda Sampaio, as presidências neoliberais de FHC e Lula kkkk trouxeram a matemática para a discussão da política social. Ao invés de um conceito de Direito universal, a linha de FHC e Lula foi de enfocar benefícios em um grupo que mais precisasse. A linha de universalista estabelece parâmetros (altos geralmente) e luta para que todos sejam neles incluídos. A focalista crê que os benefícios devem ser distribuídos proporcionalmente à necessidade. Depois de ter o básico, o restante se resolveria pelo mercado. Focalistas defendem que uma precisa definição de pobreza levaria a mais eficácia. Universalistas dizem que o monto de recursos precisa aumentar junto com a eficácia. Divergência mais profunda do que entre corintianos e palmeirenses.

Uma frase define a importância prática da discussão: “É um jogo de soma zero: se você põe em um lado, tem de tirar de outro. Então, o conceito de pobreza – absoluta e relativa – vai determinar o quanto é preciso transferir o que sempre é uma questão delicada”.

A edição brasileira deste mês da Le Monde Diplomatique ressuscita a visão “tradicional da esquerda” sobre a discussão da definição da pobreza, ausente na grande mídia. A revista discute: “Onde fica a linha da pobreza”, com textos da Aldaíza Sposati, Eduardo Fagnani e Sílvio Caccia Bava.

A linha mais conhecida para definir a pobreza é aquelas que ganham US$ 2 por dia (corrigidos por poder de compra, alias um “detalhe” que Caccia Bava esquece em seu artigo). No Brasil, há 49 milhões de pessoas nessa faixa (dados da Comissão Econômica para a América Latina). No artigo de Caccia Bava, coloca-se que, para erradicar a pobreza, é preciso promover transferência de renda dos mais ricos para os mais pobres. Como fazê-lo em curto prazo (a educação universal de qualidade é o instrumento com mais comprovada eficácia na geração de igualdade, mas demora muito tempo para gerar impacto).

Fagnani, professor do Instituto de Economia da UNICAMP (aviso: não foi meu aluno:->), afirma “que o mais grave é a implicação de que políticas universais – que beneficiam os “não pobres” – devem ser destruídas e seus recursos realocados para os pobres. “O real objetivo dessa agenda é o ajuste fiscal”. Faganini acerta na descrição histórica e no pressuposto de que o tema é atualmente, antes de social, fiscal. Mas, comete erros de leitura básica de dados, do método de cálculo de custo de vida e da pobreza.

Aldaíza dá uma aula-show em seu artigo, onde propõe una superação da briga focalismo-universalismo. Para ela a chave é estender os benefícios atuais (focais) para a categoria de direitos (universal) a ponto dos pobres poder “contar com” e “ter certeza” do acesso. Aldaíza lembra que erradicação da miséria, mesmo que conte com a ajuda dos programas de transferência de renda, fundamenta-se no acesso a serviços públicos igualitários. Acerta na receita, só não diz como pagar a conta do remédio.

Como diria nosso guru “Nunca antes na história deste país” uma linha imaginária foi tão importante.

 
Para acessar a Le Monde Diplomatique
 

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Quer Entender a Crise Financeira? Freud Explica.


A cada crise financeira, surge uma pergunta. Por que não fomos capazes de prever (e evitar) isto? É lógico que sempre aparece um para repetir a frase daquela motinho de um desenho de minha infância: “Mas, eu não te disse?” Mas, quem era pago para dizer, não disse.

Mesmo com falhas enormes nos modelos evidenciadas pela própria crise, os Economistas continuarão seres de profunda fé. Não superados nem pelos torcedores do Botafogo. Seguirão como se tivessem conhecimento do funcionamento da realidade, criando conjecturas com as quais constroem um futuro imaginário, minimizando a intrínseca incerteza na qual está ele imerso.

Foi assim desde as crises econômicas do final do séc XIX. Mas, desta vez há algo distinto na discussão: Elementos complexos, antes marginais ou até ignorados ganham destaque nas sisudas escolas de economia. E, até entre os homens de ternos escuros, os banqueiros, novas teorias ganham espaço. Economia Entrópica, Eco-Economia e a mais assanhada das novas teorias: a Pisco-Economia.

Sabe a máxima de que o mercado é coisa de louco? A Psico-Economia leva isto bem a sério. E criou o conceito de "finança emocional”. Estes estudiosos, a maioria formada por psicanalistas, defende que “a compra, a posse e a venda de ativos financeiros, em condições de intrínsecas instabilidade e ambiguidade, necessariamente levam os envolvidos nessas transações a desenvolverem, frente a elas, uma forte ambivalência emocional, bem como inúmeras fantasias inconscientes. A hipótese aqui é que são justamente as fantasias inconscientes dos gestores, as oscilações em seu estado mental e o funcionamento da psicologia de grupo o que pode explicar a formação das bolhas financeiras, um grave problema para o qual as teorias econômicas convencionais não oferecem explicações satisfatórias. Supõe que no processo de tomada de decisão financeira ocorre o mecanismo inconsciente de cisão, em função do qual ficam separados e expulsos da consciência os pensamentos que provocam emoções dolorosas, como a dúvida, a angústia e o medo. Isso faz com que fique impedida uma avaliação mais realística da situação, aumentando o risco de futuras instabilidades financeiras, com funestas e globalizadas conseqüências” (Sérgio Telles).

Os psicoeconomistas dizem ser fundamental reconhecer e aceitar esta incerteza que vem dos ativos financeiros serem abstratos e oscilantes o que contribuiriam para fobias, paranóias, psicoses de todos os tipos no estado mental dos gestores que lidam com eles.

Neste campo de trazer a bolsa para o divã, a estrela do momento David Tuckett, membro
do Instituto de Psicanálise de Londres e professor visitante de Psicanálise no University College London. Tuckett afirma que, “por mais sofisticadas que possam parecer, as teorias econômicas sobre os mercados financeiros são bastante fantasiosas quando vistas a partir de uma perspectiva interdisciplinar. Afinal, é humanamente impossível saber quanto valerão no futuro os ativos manipulados pelo mercado financeiro”. Ele, atualmente com as bênçãos e o dinheiro de George Soros, trabalha em um estudo que pretende mostrar que as tomadas de decisão no mercado financeiro são baseadas em estados emocionais dos gestores e em histórias fantasiosas criadas por eles mesmos.


Caso a hipótese de Tuckett se comprove, talvez os próximos comentaristas econômicos da TV ao invés de Keynes e Marx, vão citar Freud. E você, da próxima vez que for ao banco falar sobre investimentos e o gerente perguntar: “Agressivo ou Moderado?”, Você pode responder com outra pergunta: “Fale-me sobre sua mãe, ela era agressiva ou moderada?” :-)

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE "........."


Já pensou se você fosse a presidente? Dezenas de auxiliares. Mordomias e poder. Muito Poder. Poder para decretar que o vice-presidente precisa sorrir, proibir o Sarney de usar bigode, tornar crime inafiançável a execução dos CDs da Vanessa Camargo. Proibir locutor de Super-mercado e decretar a coca-light tradicional patrimônio nacional.

Poder de mudar o salário mínimo, inclusive. E você, um ser socialmente sensível e preocupado com pobre, nem ficaria entre a disputa 540, 560. Assinaria logo uns 600. Não! 600 até o Serra daria. Você iria logo para 2500,00, o salário mínimo segundo o DIEESE. Correto?

Aumentar o salário mínimo é muito legítimo. Querer que uma família viva com menos de R$600,00/mês é desumano.

Mas, a escolha da presidente não é tão simples assim. Alguns argumentam que, quem se preocupa mesmo com pobre, deveria defender um aumento menor para o salário mínimo.

Por quê? Estudos do IPEA mostram que o impacto do reajuste do SM na redução da pobreza já foi maior. Hoje é reduzido. Explico-me, somente 62% dos beneficiados pelo aumento do SM são pobres. Dentre os 38% restantes há inclusive um grupo significativo, 11% que tem renda acima de 10 SMs.

Para cada real aumentado no mínimo, Dilma gerará um custo estimado de quase R$200 milhões para o orçamento público nos 3 níveis federativos. Para cada bilhão gasto com aumento do mínimo, a pobreza reduziria 0.8 pp. O estudo do IPEA mostra que o mesmo bilhão aplicado nos programas sociais mais bem avaliados do governo reduziria a pobreza em cerca 1.9 pp. Mais do dobro do impacto.

Nenhum gasto público social contribui tanto para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) quanto os que são feitos em educação e saúde. Cada R$ 1 gasto com educação pública gera R$ 1,85 para o PIB. O mesmo valor gasto na saúde gera R$ 1,70.

Para a redução da desigualdade social, os gastos que apresentam maior retorno são aqueles feitos com o Bolsa Família, que geram R$ 2,25 de renda familiar para cada R$ 1 gasto com o benefício, e os benefícios de prestação continuada - destinados a idosos e portadores de deficiência cuja renda familiar per capita seja inferior a 25% do salário mínimo -, que geram R$ 2,20 para cada R$ 1 gasto.

Além disso, 56% desses gastos retornam ao caixa do Tesouro na forma de tributos.

Já cada real aumentado no SM impacta o PIB em cerca de R$1,20 e trazem R$1,46 de aumento de renda familiar.

Só o Bolsa-Família tem uma necessidade de expansão que demandaria quase 1,3 bilhão extra por ano. O plano de erradicação da miséria extrema que está em preparação no governo federal estima um custo adicional de quase 5 bilhões/ano. No orçamento deste ano, há somente um aumento de 180 milhões para expansão. E ainda assim, a expectativa é que mais de 50 milhões sejam contingenciados.

Logo, a escolha de Dilma, e sua se fosse presidente, é: aumentar o mínimo (reivindicação justa) ou investir mais para reduzir a pobreza?

Diga-me EXMO. Presidente Você, qual é sua decisão?
























sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

“Em Casa Onde Não tem Pão, Todos Gritam e Ninguém tem Razão”




Alguns vêem somente o “vento da democracia” como motivo para, depois de décadas de acomodação, população de países árabes exigirem o fim de suas ditaduras de estimação. Mas, já nos ensinavam os antigos: toda mudança vem do estômago. E, o vento da democracia tem certamente tido a propulsão do tufão da fome. Este tem varrido países com eleições regulares e gerado distintos tipos de violência. É difícil imaginar que a  com o aumento do poder do tráfico (que ajudou a transformar o corredor centro-americano+México na região mais violenta do mundo) não tenha correlação com a fome na região.

Celso Ming lembrou o ditado: “Em casa onde não tem pão, todos gritam e ninguém tem razão”. E é com preocupações voltadas para o potencial político explosivo do que está acontecendo que as autoridades do mundo começam a se mexer.

Os preços dos alimentos estão em forte escalada. Saltaram 23,9% em 2010 e, em janeiro, já subiram 3,4%. Os políticos temem a fome, embora não se preocupem com os pobres. O tema está na agenda de inúmeros almoços dos não-famintos, Ben Bernanke (FED-US), do presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick e de Tim Geithner, secretário do Tesouro dos EUA (quem vem ao Brasil para discutir uma ação conjunta sobre o tema).

As divergências são enormes e começam pelo diagnóstico.

1. Alguns dizem (Sarkozy, em nome do G-20, entre eles) que o principal problema é a ação dos especuladores, que estariam apostando dinheiro grosso na alta das commodities. Se isto é verdade, o FED americano tem sua culpa por ter injetado US$ 1,7 trilhão na economia numa operação conhecida como afrouxamento quantitativo e vai reforçando com mais US$ 600 bilhões. Mas outros BCs fizeram o mesmo, inclusive o brasuca. Esse é o principal motivo pelo qual os mercados estão encharcados de dinheiro.
2. Um segundo diagnóstico é o de que essa disparada de preços tem a ver com adversidades climáticas em grandes países produtores de grãos: seca na Ucrânia, China e Argentina; e inundações na Austrália.

3. Outro grupo de analistas aponta as compras maciças feitas por pessoas, especialmente na China, Tailândia e Bangladesh, que decidiram reforçar os estoques como medida de segurança alimentar.

4. Há, em quarto lugar, a velha acusação de que os países ricos, como os Estados Unidos, toda a União Europeia e também o Brasil, estão canalizando cada vez mais grãos para produzir biocombustíveis.

5. O quinto diagnóstico põe ênfase no crescimento do consumo. Mais de 40 milhões de asiáticos, principalmente na China, ascendem todos os anos ao mercado de consumo. Essa gente começou a se alimentar melhor. E essa é explicação suficiente para que se entenda todo o resto. Como nos acidentes de avião, não dá para excluir nenhum dos fatores. Todos eles concorrem para a produção do mesmo efeito. No entanto, o aumento do consumo global parece ser o mais importante.

Há dados para basear as 4 linhas de explicação. Porque todas são concorrentes. Não se sabe qual delas começa, mas todas contribuem para um quadro triste: Em 2008, quando os preços do arroz triplicaram, calcula-se que mais 100 milhões de pessoas voltaram para abaixo da linha da pobreza. E, de barriga vazia é geradora de conflitos.

O preço dos alimentos sofre as conseqüências de um modelo que transformou a comida em mercadoria e a gere exclusivamente pela regras de mercado. Segundo esta lógica: comida tem preço, mas não valor. Toda especulação, mesmo que gere mortes, é válida e legítima operação.

A lógica da commoditizaçao, até do que não é commodities também reduziu a produção dos produtores de pequena escala. Esta queda deve levar à indústria alimentícia a ser o maior consumidor global de alimentos, ainda em 2012. Isto provoca dois fenômenos: “comida com milhagem” e “vale quanto quero”.

Em todo mundo, a cada ano, a viagem da comida aumenta. Este cálculo curioso mede a dieta básica de uma população versus a distância onde ela é produzida. Em 1980, a comida viajava em média 146 km até o consumidor. Em 2010, esta distância chegou a 309 km. Logo, o arroz que eu quero comer, é também disputado por outros. Principalmente pela indústria.

O segundo reflexo da crescente intermediação da indústria na alimentação faz dela o grande regulador de preços. Compra em quantidades que baixam o preço. Vende em quantidades que o fazem aumentar. Mercados mais integrados competiriam mais eficazmente pelos produtos. mas já nos provavam Nash e Stiglitz que isto só existe em mercados com informação simétricas. Em outras palavras, nunca :-). A lei da oferta e procura até existe, mas seus juízes são parciais.

No Brasil, a discussão sobre o valor do SM tem a influência deste tema. A inflação aumentou e com ela os riscos de redução nos níveis de segurança alimentar. No período de 12 meses terminado em 31 de janeiro, os preços internacionais das commodities alimentares subiram 28,3%. Os da soja acumularam alta de 55%; os do milho, 64%; os do açúcar, 54%; os do café, 80%; e os do trigo, 50%. Essa estocada já está provocando inflação e, mais cedo ou mais tarde, os bancos centrais serão obrigados a atacar com alta dos juros.

Em resumo, inflação e pobreza nunca ficam longe o suficientes para que esqueçamos deles.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Países deixam pobreza, mas População Não.


Países deixam pobreza, mas população não. 75% dos pobres do mundo não vivem mais em países pobres.

É o que revela o estudo “E se Três Quartos dos Pobres do Mundo Viverem em Países de Renda Média?”, conduzido por Andy Sumner, do Instituto de Estudos sobre Desenvolvimento (IDS, Reino Unido), publicado pelo CIP-CI/UNDP.

O estudo de Sumner é um reforço na tese de que a linha de medição de pobreza internacional do Banco Mundial está se descolando da realidade.

A hipótese é simples. Se um indicador não capta a situação das pessoas, ela se tornou caduco. A linha de pobreza do Banco Mundial ainda funciona para analisar o “desenvolvimento potencial”, ie, os recursos nacionais disponíveis.

As assimetrias na correlação entre riqueza de um país e de sua população já tinham sido apontadas. Com exceção de dois pequenos grupos: os extremamente pobres e os alto-médios ricos, em todo o restante não há sincronia.

A constatação levanta questionamentos sobre a classificação das nações de acordo com o PIB per capita, adotada desde o início dos anos 1970 pelo Banco Mundial (BIRD). A renda de uma série de países ultrapassou a barreira dos US$ 995 nos últimos 20 anos, mas apenas uma pequena parcela de sua população efetivamente vive com mais de US$ 1,25 por dia.

Para o BIRD, uma economia de renda média tem PIB per capita situado entre US$ 996 e US$ 12.196.

Número de nações pobres caiu de 60 para 39 desde 1990; economias médias passaram a reunir 75% da população em condição de miséria.

Com a diminuição do número de países pobres de 60 para 39 desde 1990, e a consequente ascensão desses territórios à categoria de economias de renda média, cerca de 75% das pessoas que vivem com menos de US$ 1,25 por dia estão hoje em nações cujo PIB per capita está acima da linha que define se um Estado é pobre ou não, avaliada em US$ 995.

Em 1990 cerca de 93% das pessoas em situação de miséria viviam em economias frágeis. Em contrapartida, entre 2007 e 2008, três quartos dos cerca de 1,3 bilhão de pobres do mundo viviam em nações de rendimento médio.

Imagine que hoje o Objetivo do Milênio 1 (redução da pobreza) fosse atingido em 100% dos países pobres do mundo. Ainda haveria900 milhões de pessoas pobres vivendo nos países estáveis e com rendimento médio.

Houve uma redução de pobres nos países mais pobres (ou frágeis). 23% das pessoas em situação de miséria vivem em Estados frágeis e afetados por conflitos, dez pontos percentuais a menos do que o estimado há duas décadas.

Sumner coloca sua opinião sobre o motivo do deslocamento: “Crescimento sem transformação social, econômica ou política são um ponto de partida para explicar a persistência de altos níveis de pobreza absoluta nos países de renda média. Quando se faz uma análise desse grupo, mudanças no emprego agrícola são evidentes, mas, surpreendentemente, há poucas alterações na desigualdade e nas receitas fiscais”.

























sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

O que a tragédia no Rio nos Ensina


Resumo com dados da Cruz Vermelha e OESP
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1. Melhorar sistemas de alerta e ter mais radares em rede
Apesar de o País contar agora com o Tupã, supercomputador que rodará modelos de previsão mais precisos, é necessário investir em soluções complementares. Com o aquecimento global, a tendência é que chuvas intensas sejam mais frequentes. É urgente a criação e manutenção 24 horas de centros meteorológicos em cada Estado e a ampliação do número de radares ligados a uma central.


2. Integrar, equipar e mapear para agir rápido e ser eficaz
Caso seja dado o alerta de emergência, é necessário que ele chegue rápido aos locais apontados. E, para o alerta ter eficácia, é preciso que prefeituras, governos estaduais e federal estejam articulados e preparados para agir rápido, com base num plano de contingência consistente e centralizado em um comando único. Criar defesas civis municipais, equipar melhor as que existem e mapear todas as áreas de risco são ações fundamentais.


3. ESTIMULAR INTEGRAR  & PROFISSIONALIZAR A RESPOSTA
Há descoordenação nas ações de resposta tanto governamentais quanto da sociedade civil. A enorme resposta solidária mostrou que a sociedade tem disposição e capacidade de apoiar, doar e ajudar. Porém os sistemas de ajuda governamentais não facilitam a canalização eficaz dos recursos da sociedade civil (a legislação brasileira dificulta as doações) e a descoodenação/amadorismo da resposta não dispõe os recursos de maneira sinérgica.


4. Informar, educar e avisar as pessoas sobre o alerta
Como a população não está acostumada a esse tipo de alerta, é necessário investir em educação nas escolas e por meio de cartilhas que preparem para o que fazer caso seja necessário evacuar as casas. As pessoas precisam ter garantia de que já terão um abrigo e saber como se deslocar até o local. Prefeituras e Defesa Civil devem organizar cadastros detalhados dos moradores em áreas de risco e saber quem tem dificuldades de locomoção.

5. Acabar com áreas de risco requer controle do solo
Se as chuvas intensas tendem a ser mais frequentes nos próximos anos, o impacto delas deve ser ainda pior caso a ocupação de áreas de risco continue crescendo desordenadamente no País. Para retirar todas as pessoas e evitar novas ocupações, é preciso oferecer opção de moradia segura e controlar efetivamente o uso e ocupação do solo. Deve haver fiscalização e cumprimento das leis e contenção da especulação imobiliária.

6. Restituir e conservar várzeas dos rios, encostas e florestas
Para recuperar e ao mesmo tempo proteger cidades encravadas em regiões serranas uma solução é a criação de parques naturais, ao longo das várzeas de rios. Quando transformados em unidades de conservação ou em áreas de preservação permanente, os locais não podem mais ser ocupados. O desafio, nesse caso, é retirar quem já mora nessas áreas. Outra medida é evitar a canalização de cursos d"água e a impermeabilização do solo.


7. Saber construir para mitigar impacto da chuva
Além de ações de grande porte, que envolvem poder público, ações individuais, principalmente se multiplicadas, contribuem muito para diminuir os efeitos devastadores das chuvas.
Recuperar jardins, manter quintais permeáveis, instalar telhados verdes e tanques para reter água, que pode ser usada para regar plantas, aumentar permeabilidade de pisos e calçadas e não jogar lixo nas ruas são bons exemplos.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Fim de Ano, Hora de falar de Avaliações

Mesmo com recursos (pessoas, insituiçoões e tecnologias) que, se não são sufientes, também não são desprezíveis, o Brasil investe insignificantes recursos em avaliação. Pior, não há garantia de que as avalições seja feitas de maneira imparcial e, a pá de cal:  não vincula avaliação como procedimento legal para análise oraçamentária e de continuidade de políticas. Em resumo, mesmo o que se avalia, não há garantia sobre seu processo e "usabilidade".

Romulo Paes, executivo do MDS e especialista no assunto, faz um balanço das atividades na área (positivo, pq nao é da natureza de governantes fazerem auto-crítica rsrs) e aponta um agenda necessária para a avaliação.


 

A hora e a vez da avaliação das políticas públicas

(Do Valor)


 

Rômulo Paes

22/12/2010

A gestão pública tem incorporado recentemente novas funcionalidades no Brasil e no mundo. Uma delas é a necessidade de se monitorar e avaliar as políticas e ações públicas. A experiência brasileira está se tornando uma referência, mas ainda é necessário consolidar essa atividade na administração.

Com um modelo federativo descentralizado e níveis de gestão autônoma nos Estados e municípios, o Brasil é grande e diverso. Além disso, a administração tem um tamanho considerável - o país tem uma das maiores estruturas de gestão pública do mundo.
Isso é devido a dois motivos. Um deles é o tamanho da população - a prévia do Censo 2010 calcula a existência de 190,7 milhões de brasileiros. O outro é a forte presença do Estado, que optou por operar e ofertar bens e serviços públicos, sobretudo na área social, enquanto outros governos preferiram transferir essas tarefas para o setor privado.

Todos os níveis governamentais - federal, estaduais e municipais - estão hoje preocupados com a qualidade dos serviços sociais e, por isso, a boa gestão é essencial. Essa característica da administração pública brasileira fez surgir avaliações e monitoramentos nas duas direções, ou seja, não apenas de cima para baixo mas também de baixo para cima.
A avaliação de cima para baixo trata do esforço que as instâncias de coordenação fazem para que o governo acompanhe ampla e horizontalmente suas ações. É o caso do Sistema de Informações Gerenciais e de Planejamento (Sigplan), do Ministério do Planejamento, e do monitoramento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), da Casa Civil.
O inverso também ocorre: as áreas setoriais se esforçam em desenvolver sistemas que tenham maior interface com seus temas. Aí encontramos experiências não só no executivo, como no Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) e Ministério da Educação, mas também no próprio Tribunal de Contas da União (TCU).
No MDS, foram mais de 92 pesquisas concluídas, em execução ou em processamento entre 2005 e 2010, sendo 20 delas sobre o programa Bolsa Família. O IBGE também tem contribuído com as PNADs e diversos suplementos requisitados e financiados pelo Ministério. Elaboramos ainda pesquisas longitudinais, como a que avaliou as condições de vida de 11,4 mil domicílios, inscritos ou não no programa Bolsa Família, em 2005, (Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional de Minas Gerais, da Universidade Federal de Minas Gerais, o Cedeplar), e depois em 2009 (Instituto Internacional de Pesquisa sobre Políticas Alimentares/Datamétrica, IFPRI). São estudos robustos, essenciais para avaliar e monitorar um programa desse porte, que atende a 12,4 milhões de famílias.
Essas pesquisas ajudam a redimensionar a implementação das políticas públicas. Um exemplo de adequação foi incluir jovens de até 17 anos no Bolsa Família, ao constatar que meninos e meninas de 14 anos estavam abandonando as atividades escolares. Os estudos apontaram também que a permanência das crianças na escola - estimulada pela condicionalidade do programa - não garantia um melhor desempenho, até porque as unidades de ensino tinham dificuldades em receber esses alunos antes excluídos. A segunda etapa do estudo do IFPRI (2009), no entanto, mostrou que esse desempenho melhorou porque as escolas estavam mais adaptadas para a demanda e também as famílias compreendiam melhor a exigência do programa. Os estudos de avaliação permitem um redesenho dos programas, direcionando-os para ações mais eficazes e eficientes, o que futuramente gera melhor alocação de recursos e ações de melhor qualidade.
Assim, a necessidade de monitoramento e avaliação aparece nas instâncias de coordenação e também nas unidades executoras, demonstrando uma convergência conceitual e metodológica, demandando compartilhamento de ferramentas, capacitações e desenvolvimento de competências. Isso reflete o esforço dessas áreas para o maior domínio do monitoramento e avaliação, trazendo luz a questões relacionadas à execução de programas.
A experiência brasileira tem aspectos inovadores porque os estudos de implementação das políticas possuem grande relevância. No caso das políticas sociais, são os municípios que as executam e acompanham beneficiários, constroem e administram unidades de segurança alimentar e nutricional, por exemplo. Mas a diversidade das administrações gera uma heterogeneidade muito grande na execução das políticas. Assim, analisar e avaliar a implementação pode explicar e ajudar a compreender a variação encontrada nos resultados dos programas.
A experiência do executivo federal tem se multiplicado em instâncias estaduais - Pernambuco, São Paulo, Ceará e Minas Gerais - e municipais. Há também envolvimento das universidades tanto na execução de estudos específicos como na formação de profissionais. Temos experiências na Escola Nacional de Administração Pública (Enap), na UFMG, no Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia, na Fundação Osvaldo Cruz e no IPEA.
Por fim, temos os organismos internacionais buscando disseminar esse tipo de experiência, ao mesmo tempo permitindo que os resultados brasileiros sejam conhecidos e reconhecidos no exterior.



O Brasil hoje se encontra numa situação ímpar. Mas ainda temos muitos desafios, como a pouca quantidade de especialistas nos órgãos públicos e a necessidade de contratação de pesquisas de longo prazo, que muitas vezes são incompatíveis com os tempos legais da administração pública.



É chegada a hora de termos uma ação mais organizada e coordenada pelas instâncias competentes. É chegada a hora de disseminarmos o conhecimento da avaliação e monitoramento de políticas públicas, não apenas no governo federal mas também nos Estados e municípios. É importante também termos publicações específicas sobre o assunto e fortalecermos as redes disseminadoras desse conhecimento e os eventos voltados exclusivamente para apresentação de resultados, compartilhamento de metodologias e ferramentas. Esse é o passo adiante que devemos tomar.


 
Rômulo Paes é secretário-executivo do MDS, médico, especialista em Avaliação de Políticas Públicas, PhD em Epidemiologia, pela Universidade de Londres.
 

domingo, 12 de dezembro de 2010

Medida de Pobreza



(trechos das entrevistas da Agência Brasil)

Sempre que me perguntam: “quantos pobres há no Brasil”? Eu respondo com outra pergunta: “Segundo qual critério?”

Mas a culpa não é minha. Pelo menos, não neste caso. Também não há fórmula internacional consagrada. O Banco Mundial, por exemplo, utiliza a faixa de US$ 1 dólar por dia por pessoa como linha de indigência e de US$ 2 dólares por dia por pessoa como linha de pobreza. Tudo corrigido pelo poder de compra do dólar em cada país (PPP).

Já a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) utiliza dados sobre os custos da cesta básica por área geográfica.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de três brasileiros a cada grupo de dez não vivem com segurança alimentar (refeições necessárias e ingestão suficiente de nutrientes) e 11,2 milhões de pessoas ainda passam fome.

O IPEA Tb tem sua linha de pobreza, que segue a lógica da CEPAL, com algumas variantes de cálculo que incorporam o salário mínimo.

Para acabar com esta falta de resposta volta à tona uma discussão de 30 anos. O estabelecimento de uma linha de pobreza oficial, no Brasil. Estima-se que a presidente Dilma estabelecerá linhas oficiais de pobreza e de indigência no país para monitorar as políticas sociais do governo e medir a melhoria das condições de vida da população.

Não é uma discussão teórica. Dilma prometeu erradicar a miséria até o final de seu mandato. Para fazer isto, temos que saber quem são os miseráveis e daí, estimar o custo de tal empreitada.

“Se vamos erradicar a miséria, temos que ser capazes de medir a miséria. Tem que ter uma linha de pobreza e uma linha de miséria, o que não tem consenso”, diz o economista Ricardo Paes e Barros, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

PB, como é conhecido, foi o coordenador da área de políticas sociais da campanha de Marina Silva e é um dos maiores especialistas no tema, em todo o mundo. Ainda segundo ele, “Sem chegar no acordo de qual linha a gente está falando vai ser difícil saber se cumpriu ou não o objetivo”, alerta, reconhecendo que “a pobreza está despencando no Brasil para todas linhas de medição”.

Abaixo outros trechos da matéria da Agência Brasil:

O economista da Fundação Getulio Vargas (FGV), Marcelo Neri, propôs para a equipe de transição do futuro governo  a linha de pobreza de R$ 108 por pessoa da família. Com estimativas de crescimento, esta linha de pobreza faria a meta de Dilma custar algo em torno  de R$ 13 bilhões.

 A ideia de Neri é que a meta de erradicar a miséria seja tratada como a meta de inflação. “Se tem uma meta de erradicar a pobreza é preciso saber qual o critério. Do mesmo modo que há uma meta de inflação, que escolheu o IPCA [Índice de Preços ao Consumidor Amplo] como medida”.

Para Marcio Pochmann, presidente do Ipea, o Brasil está na direção correta, mas é preciso uma sofisticação nas políticas. “Por isso, se pensa ser necessário estabelecer uma linha administrativa da pobreza extrema”, disse.

O Ipea está fornecendo dados e análises para a definição dessas políticas e para fixar as linhas de miséria e de pobreza. Pochmann não quis adiantar os valores, mas assinalou que não é apenas uma “decisão monetária” ou “administrativa e política”, mas também uma escolha “técnica com base na realidade”.

Marcelo Neri sugere que a verificação da renda das famílias seja mais criteriosa e não se baseie apenas na informação da renda reportada, mas também em dados sobre todos “ativos” das pessoas do domicílio (tipo de trabalho, condições de moradia, acesso a serviços públicos, como saúde e educação) e “carências” (crianças lactantes, pessoas com deficiência e idosos na família).

Segundo ele, a referência ao salário mínimo não deve ser utilizada porque há diferenças no valor real com o passar do tempo. O poder aquisitivo de um quarto de salário mínimo hoje é maior do que no começo da década, explica.

A escolha da linha de pobreza e dos valores que deverão ser repassados para que as famílias mais pobres alcancem um patamar de subsistência considerado mínimo pelo futuro governo depende também do cenário macroeconômico, como geração de emprego e renda e aumento de impostos arrecadados pelo Estado para custear gastos sociais, além da microeconomia entre os mais pobres.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

ANALFABETISMO FUNCIONAL


O IPEA divulgou um importante e sumário estudo sobre o Analfabetismo funcional, no Brasil. (elaborado por Paulo Corbucci, com Eduardo Luiz Zen, Maria Piñon e da equipe de estatísticos da Assessoria Técnica Presidência)

Abaixo, uma síntese pessoal, com trechos retirados do próprio estudo. O estudo mostra que o analfabetismo tem sido reduzido de forma lenta no Brasil, inclusive se comparado a alguns países. Em grande medida, esse ritmo de redução se deve à incipiente inserção nos programas de alfabetização de jovens e adultos, assim como à sua baixa efetividade. O Brasil fez uma opção por deixar os que são analfabetos e prevenir novos. Tal afirmação é corroborada pelo aumento de cerca de 12% no contingente de analfabetos nesta faixa etária, no período analisado.

No contexto latino-americano, o Brasil se encontra em situação desfavorável em relação a quase todos os países. No entanto, deve-se ter cautela ao estabelecer comparações dessa natureza, dada a grande diversidade entre os mesmos, sobretudo no que se refere à formação histórica e dimensão populacional.

A definição de alfabetização que a Unesco propôs em 1958 limitava-se à capacidade de ler compreensivamente ou escrever um enunciado curto e simples relacionado à sua vida diária. Ainda hoje, esta é praticamente a definição utilizada pelo IBGE: são consideradas analfabetas as pessoas que não conseguem ler e escrever um bilhete simples.

Por sua vez, o conceito de analfabetismo funcional remonta, remonta à década de 1930, quando o exército norte-americano cunhou a expressão alfabetismo funcional como sendo “a capacidade de entender instruções escritas necessárias para a realização de tarefas militares.”

Coube à Unesco, no entanto, a disseminação da expressão a partir de 1978. Sob essa perspectiva, a pessoa que estivesse funcionalmente alfabetizada seria aquela em condições de inserir-se adequadante em seu meio, sendo capaz de desempenhar tarefas em que a leitura, a escrita e o cálculo são demandados para seu próprio desenvolvimento e para o desenvolvimento de sua comunidade.

Como tal definição não é passível de mensuração, o alfabetismo funcional passou a ser definido operacionalmente pela quantidade de anos de estudo. No entanto, dada a diversidade de contextos socioeconômicos e culturais existentes no mundo, não se tem um padrão de referência único. Por exemplo, países latino-americanos, entre os quais o Brasil, têm adotado como parâmetro definidor do analfabetismo funcional o nível de escolaridade inferior a 4 anos de estudo. No entanto, países ricos em geral adotam patamar mais elevado, em torno de 8 anos.

Além de tais padrões serem relativos, sabe-se que o número de anos de estudo nem sempre guarda relação direta com as habilidades de leitura, escrita e, principalmente, com a capacidade de interpretar textos e de raciocinar matematicamente. Evidência disso é que parcela das crianças brasileiras chega à 4ª série do ensino fundamental sem ter sido devidamente alfabetizada e, portanto, não seria um ano a mais de estudo que lhes alçaria à categoria dos funcionalmente alfabetizados.

Por fim, deve-se ter em mente que a desejada redução do analfabetismo gera, no curto e médio prazos, aumento do analfabetismo funcional. Portanto, a elevação deste indicador não significa, necessariamente, o agravamento da situação educacional de um povo, mas, sim, um passo intermediário na efetivação do direito de todos à educação.

Norte: O número de analfabetos diminuiu 5,1%, mas a taxa de analfabetismo teve redução da ordem de 17%, ou seja, acima da média brasileira. Em termos de UF, o destaque ficou para o Amapá, cuja taxa reduziu-se em cerca de 66%. Com isso, a taxa de analfabetismo neste estado passou a ser a mais baixa do Brasil: 2,8%.

Nordeste: O total de analfabetos caiu 8%, enquanto reduziu-se em 16,6% a taxa de analfabetismo. Todos os estados da região tiveram redução em termos absolutos e relativos. No Rio Grande do Norte, a proporção de analfabetos foi reduzida em 18,6% e na Bahia o número absoluto caiu 10%. Em ambos os casos, os índices são superiores à média nacional.

Sudeste: A redução do contingente de analfabetos (6,6%) foi ligeiramente menor que a média nacional. Apenas o Rio de Janeiro registrou índice mais favorável (12,3%). No entanto, a taxa de analfabetismo na região (5,7%) aproxima-se da taxa na região Sul (5,5%), que é a mais baixa do país.

Sul: Também nesta região a redução do número de analfabetos ficou abaixo da média nacional, devido ao aumento ocorrido em Santa Catarina (14%). Como, porém, o crescimento populacional neste estado também foi maior do que a média nacional, sua taxa de analfabetismo cresceu apenas 0,1 p.p. e atingiu 4,9% em 2009.

Centro-Oeste: Trata-se da região que apresentou menor queda do número absoluto de analfabetos (1,6%), uma vez que os estados de Mato Grosso do Sul e, principalmente, Mato Grosso tiveram aumento deste contingente. Mesmo assim, houve queda de 1,2 p.p. na taxa de analfabetismo na região, que atingiu 8% em 2009. Goiás e Distrito Federal lideraram essa tendência.



Desigualdades:

Analfabetismo funcional é bastante desigual, segundo as variáveis de destavantagem tradicionais, no Brasil: i) localização do domicílio; ii) raça ou cor; iii) sexo; e iv) renda.

Entre residentes de áreas rurais, a taxa aproximava-se de 23%, em 2009, enquanto a de moradores das cidades situava-se pouco acima de 7%. De todo modo, as maiores desigualdades se aprofundam quando se comparam os índices registrados nas UFs. Por exemplo, a diferença entre Alagoas e Rio Grande do Sul chega a 5 vezes.

Em relação à raça/cor, também são identificadas profundas desigualdades entre os níveis de analfabetismo de brancos e pretos/pardos. Entre os brancos, o índice caiu de 7,2% para 5,9%. Por sua vez, a taxa registrada por pretos e pardos declinou de 16,3% para 13,4%. Apesar de, entre estes, a taxa ter sido reduzida em quase 3 p.p., no período 2004-2009, não houve diminuição relativa da distância que separa esses dois grupos. No âmbito de cada região, porém, houve redução dessa diferença no Centro-Oeste, Norte e Sul, tendo o inverso ocorrido nas demais regiões. No entanto, deve-se ressaltar que pretos e pardos no Sudeste estão em situação bem mais vantajosa que os do Nordeste. Se entre aqueles a taxa de analfabetismo é de 8%, entre estes, ultrapassa 20%. Portanto, a desigualdade entre pretos e pardos que habitam essas duas regiões é maior que aquela entre brancos e pretos/pardos em nível nacional. Em alguma medida, a situação educacional segundo o recorte étnico é afetada pela variável socioeconômica.

Ainda que não fosse significativa a diferença da alfabetização entre homens e mulheres, como se observa em diversos países em desenvolvimento, houve sensível aproximação entre eles no período 2004-2009. Se, naquele ano inicial, o diferencial em favor das mulheres correspondia a 3,7%, em 2009 foi reduzido a 2,5%. Com isso, as taxas de analfabetismo de ambos os grupos ficaram, respectivamente, 0,1 p.p. abaixo e 0,1 p.p. acima da média nacional. Cabe ainda ressaltar que as diferenças entre os sexos são substancialmente maiores no âmbito de cada região. Enquanto em nível nacional a taxa entre homens é 2,5% maior que a das mulheres, nas regiões essa diferença oscila entre 8,5% e 21,5%.

É em renda que se evidenciam as maiores disparidades entre as taxas de analfabetismo no Brasil. Considerando-se os estratos de renda adotados pelo IBGE, verifica-se que o analfabetismo entre pessoas que se situam na faixa de renda familiar per capita maior que três e menor que cinco salários mínimos (SMs) é cerca de 20 vezes menor que as pertencentes à faixa de até um quarto de SM. Entre pessoas com renda familiar per capita superior a dois SM, a taxa de analfabetismo é de apenas 1,4%. No entanto, este segmento populacional é minoritário, pois corresponde a menos de 20% dos que declararam rendimentos. Desse modo, a faixa de até dois SM. concentra 93% dos analfabetos que declararam rendimentos.

Quando se agrega a variável regional, verifica-se aumento dessas disparidades. Por exemplo, o analfabetismo atinge 24,4% dos que se enquadram na primeira faixa de renda na região Nordeste, enquanto no Sudeste o índice é de 10,5%. Portanto, apesar de a variável renda evidenciar estreita relação com a incidência do analfabetismo, seu efeito é diferenciado quando se agregam variáveis que interferem, por exemplo, na oferta de educação de jovens e adultos.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

SURPRESAS ESPERADAS


Um sistema de bom monitoramento diminui as surpresas da vida. Isto se aplica ao nosso sistema estatístico. Excelentes pesquisas anuais e setoriais aliados a modelos competentes de projeção fazem com que o Censo 2010 tenha baixa capacidade de surpreender.

Mas, a vida é surpresa. Até para os estatísticos. E o Censo já revela algumas. Ainda em seus resultados brutos, e só com a contagem divulgados já é possível antever alguns resultados que contradizem as projeções.

Mesmo que nada tenha surgido que mostre que a direção das estimativas estava errada, o Censo 2010 promete algumas surpresas quanto ao ritmo.

Certa vez li que a coisa mais perigosa para um navio não é o mar, é a terra. Os modelos projecionais temem a realidade.

Vamos ao que já revelam os dados:

1. Cidades pequenas (<100mil hab.) seguem seu processo de esvaziamento, mas ele se intensificou. Exceção são as cidades pequenas dependentes de outras médias, as chamadas cidades-região.

2. Regiões metropolitanas não são mais fortemente atratoras de população, talvez porque sejam as regiões que menos se desenvolveram (reduziram menos a pobreza e desigualdade do que as demais).

3. As cidades que mais cresceram no decênio (consolidando, mas superando ainda mais as estimativas) são as cidades médias e grandes (não-metropolitanas).

4. O crescimento urbano parece ter chegado próximo ao seu limite. Muito dificilmente passe dos 84%.

5. Os dados demográficos mostram que na média o Brasil atingiu o limite mínimo considerado ideal de fecundidade. Se as taxas seguirem caindo, teremos problemas de reposição populacional a partir de 2040.

6. O envelhecimento da população se mostra forte, mas menos do que esperado. Parte disto talvez possa ser explicada pelas análises das tabuas de mortalidade anuais. Segundo estas, o aumento da expectativa de vida ainda é refreado por causas externas e decorrentes de mudanças insalubres em estilo de vida.

7. Todos os pontos acima continuam desiguais, ie, são distintos quando enfocados pro uma análise por decis. Os últimos decis de renda seguem com comportamentos demográficos mais próximos aos anos 70.

Quando forem divulgados os dados, no próximo ano, certamente outras surgirão. Só não se surpreende quem substitui a realidade por seus modelos.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

A Fatura do Microcrédito

Problemas em microfinanceiras privadas. Fechamento de áreas de microcédito na Ásia. Esgotamento de modelo? Mudança de paradigma? A onda do microcrédito não é uma marola:-)
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Sinal amarelo no microcrédito
MAC MARGOLIS

O pedido de socorro das instituições de microcrédito indianas na semana passada reverberou.
A agonia do SKS Microfinance, com quase US$ 2 bilhões de empréstimos atrasados, varreu Wall Street, onde as ações do banco e de seus investidores oscilaram violentamente. Na dúvida, o grupo rival Share MicroFin, do bilionário neozelandês Christopher Chandler, adiou sua oferta pública de ações de US$ 221 milhões e adiou a fusão com outra microbanco. Enquanto a poeira voava, analistas internacionais se apressaram em rever suas apostas de crescimento vitaminado para esse setor que ganha clientes, operadores e devotos da África à América do Sul.
Será o prenúncio da próxima bolha, o colapso global das microfinanças?
Para os aficionados do setor, a crise da Índia é um alerta geral sobre um desvio fatal do microcrédito. O problema, segundo essa versão, não é estender crédito aos pobres - historicamente excluídos do crédito bancário -, mas sim lucrar com eles. Pois a taxa de juros exigida pelos microbancos privados seria escorchante, até criminosa: 27% ao ano no caso de SKS, ainda mais em outros bancos. Assim, os emprestadores anjos estariam traindo sua implícita missão social, induzindo o pobre a tomar dinheiro em termos que jamais conseguiria honrar.

Seria nada mais que a velha agiotagem de roupa nova. A solução? Intervenção do governo no mercado, tabelamento de juros e carência e anistia para os vulneráveis. Senão, será a crise subprime em reprise, agora com países pobres no papel da bola da vez.

Proteger os últimos na fila e obrigar os bancos a emprestar com mais responsabilidade faz parte do evangelho pós-crise global. Mas a crise no "nanocapitalismo" indiano suscita outra dúvida menos visível. O microcrédito funciona? Ajuda mesmo os pobres a se converter em empresários, e assim se elevar da miséria?

As perguntas parecem um despropósito. Afinal, emprestar centavos a centenas de milhões virou cânone da política de desenvolvimento esclarecido. Rendeu o Prêmio Nobel a Muhammad Yunus, economista e fundador do Grameen Bank, de Bangladesh, e se espraiou pelo planeta. A iniciativa privada abraçou a causa, e o setor hoje conta com quase 1.100 operadores que ostentam 78 milhões de pequenos tomadores, das palafitas de Daca aos cortiços do Harlem, com uma carteira global de US$38 bilhões.

Gente que jamais passaria pela catraca de um banco tem hoje acesso a pequenas, mas importantes somas (US$ 10, US$ 20 ou US$ 100 de uma vez), que, segundo Yunus, alçam da pobreza 5% dos clientes do Grameen Bank todo ano. É só ver o programa Credi-Amigo, do Banco do Nordeste. No seu livro sobre o programa, Microcredito, o mistério nordestino e o Grameen brasileiro, o economista Marcelo Neri, da Fundação Getúlio Vargas (FGV) do Rio, mostra que os clientes do Credi-Amigo pagam piamente seus credores e boa parte deles encontra um atalho para uma vida melhor. Sem subsídios.
Socorro. Mas, apesar dos bons exemplos, não há nenhum consenso sobre a meta principal do microcrédito: a de reduzir a pobreza. Um recente seminário em Nova York reuniu alguns dos maiores estudiosos do tema. Houve muito Power Point, mas sobraram dúvidas.

O professor Abhijit Banerjee, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, descobriu que apenas 5% dos 7.400 clientes da microfinanceira Spandana, em Hyderabad, na Índia, fundaram empresas e quase ninguém aumentou os gastos com bens de consumo ou a educação formal. Idem para as Filipinas e Bangladesh, enquanto no Marrocos, dos 5 mil beneficiários da Al-Amana Microfinance, uma fração apenas consolidou suas empresas, melhorou a vida das mulheres, ou conquistou "grandes melhoras no seu bem estar".

Oferta. Sim, microcrédito pode ser crucial em momentos de crise ou desastre. Foi o caso do Haiti, após o terremoto, quando a financeira Fonkoze rapidamente levou dinheiro vivo a milhares de sobreviventes enquanto o sistema bancário estava paralisado. Mas passar do assistencialismo ainda é um desafio, já que levar dinheiro aos mais pobres custa dinheiro que os puristas não admitem que seja cobrado.

É o caso do banco mexicano Compartamos, maior operador privado de microcrédito da América Latina (1,3 milhão de clientes) que vive bombardeado por acusações de ganância. E, mesmo assim, nem o próprio banco sabe se seus empréstimos fazem muita diferença para os mais pobres. "Essa é uma indústria nascida de oferta e não de demanda", explicou ao seminário o fundador da instituição, Carlos Danel, que encomendou um estudo da Universidade Yale sobre o banco. "Ainda não sabemos como melhorar a vida dos clientes."

Alguns dos melhores resultados acontecem quando os microempréstimos se direcionam não aos mais pobres, mas sim às pessoas que já mostram vocação e visão empreendedora. Se não, tomar dinheiro, mesmo em doses mínimas, pode acabar complicando a vida de quem já vive na berlinda, afogando-o em obrigações e dívidas impagáveis - uma micro-tragédia com grandes consequências.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

As 500 Maiores Discriminadoras



Pesquisa divulgada pelo Instituto Ethos e Ibope Inteligência mostra o imenso abismo entre a representação demográfica e o quadro de chefia nas 500 maiores empresas do país.


A participação das mulheres e dos negros segue muito menor do que a mínima esperada. Pouca coisa mudou em relação ao último levantamento, de 2007.



  • Nos postos de diretoria a participação feminina é de  13,7% (11,5%, em 2007)
  • No nível de gerência, se 17,4% dos postos eram ocupados por negros (pretos e pardos) há três anos, hoje são 25,6% entre a amostra total, de 13 mil pessoas.
  • No caso de mulheres negras, elas acumulam os preconceitos. Apenas 6 mulheres negras ocupam cargos de direção nas 500 maiores empresas do país!


O tipo de levantamento e sua ainda pequena série histórica não permitem extrapolar com precisão científica. Mas, como exercício, se a situaçao continuasse a evoluir neste ritmo (projeção mais otimista do que imaginar que o Guarani escapará da série B :-), demoraria cerca de 28 anos para que que as mulheres brasileiras tenham um quadro semelhante ao nórdico (países c/menor brecha de gênero do mundo). Quanto aos negros, no atual ritmo, somente em 2061, eles teriam uma representação próxima à demografíca. 

Pelo jeito, nas 500 maiores empresas brasileiras,  a diversidade continua a viver somente nos bonitos códigos de ética, os elaborados discursos sobre a diversidade e os coloridos relatórios de responsabilidade social.


O texto todo em:



“PERFIL SOCIAL, RACIAL E DE GÊNERO DAS 500 MAIORES EMPRESAS DO BRASIL E SUAS AÇÕES AFIRMATIVAS”

http://www.ibope.com.br/produzindoconhecimento/download/perfil_500_empresas_helio_gastaldi.pdf