sexta-feira, 29 de julho de 2011

UMA NOVA TRADUÇÃO DE "FAMINE" EM PORTUGUÊS.


Na ausência de uma tradução precisa para a palavra FAMINE, usamos FOME. Mas, isto é profundamente inexato. Melhor seria traduzir FAMINE por "FALTA DE VERGONHA".


A ONU declarou (pela primeira vez desde a década de 80) que duas regiões do Chifre da África estão agora em um estado de FAMINE. Sim, a fome você declara sozinho, FAMINE é declarada formalmente, têm documentos e critérios técnicos. Acontece quando 30% da população de crianças está com desnutrição aguda, 20% da população geral está sem comida, e 2 em cada 10.000 adultos morrem (ou quatro por 10.000 crianças por dia). A situação é tão grave que a maioria da área excede esses limiares funestos.

Mas não se iluda com a discussão técnica. FAMINE não é um termo que remeta a estatísticas e imagens. FAMINE hoje significa que 11,5 milhões (e este número crescerá muito nos próximos meses) de pessoas com nomes, rostos, que amam e tem sonhos precisam de assistência humanitária em todo o leste da África PARA NÃO morrerem de fome.

A ONU foi lenta, dizem os críticos que sempre é. Doadores ocidentais e as ONGs, também poderiam ter feito mais. Há relatórios de 18 meses atrás que previam esta situação. Mas nada parece existir no século 21, sem que apareça antes nas câmeras de televisão e vídeos do Youtube. O ciclo vicioso faz com que os recursos só apareçam quando é impossível ignorar a crise. O problema é que'muita gente já terá morrido e o custo de resolver a situação será mais alto. Um exemplo recente, no Níger em 2005, o custo da ajuda era de US$ 7 /pessoa quando a situação apareceu. Ninguém fez muito; houve uma FAMINE (nunca declarada) e o custo de ajuda terminou em US$23/pessoa. Incentivos econômicos e sistemas de alerta precoce dizem que os doadores devem agir mais cedo. Mas, os incentivos políticos aconselham atraso até que seja tarde demais.

Além de tardia, a resposta dos doadores tem sido irregular e pífia.O Brasil, pore exemplo, exemplarmente se comprometeu mais para a Somália do que a Alemanha e França juntas. A Itália ofereceu ZERO. De 2 bilhões de dólares a ONU diz que a região precisa,  menos da metade chegou. O dinheiro disponível para o alimento no sul da Somália vai acabar  bem antes das próximas chuvas.

Até agora, os países da OTAM estão dispostos a investir na FAMINE apenas 8% de seu esforço de guerra na Líbia. Em outras palavras, não acredite nos discursos, a realidade é que vale mais matar pelo petróleo líbio do que evitar que milhões de crianças morram. Simple as That.  Outra comparação: a ajuda aos bancos gregos equivale a mais de 60 VEZES o que seria necessário para evitar que 15000 pessoas morram de fome. Mas, evitar que um banco morra é mais importante. Simple as That, again.

O que causa uma FAMINE? Amartya Sem já havia provado a tese de que este é um fenômeno, antes de qualquer aspecto, político. Democracias não enfrentam FAMINES porque a informação flui suficientemente para parar o problema, antes que ele escalone. A tese de Sem se confirma na África.

A interminável guerra civil na Somália leva o país a não ter um governo central há 17 anos. Os grupos armados (islâmicos e animistas) que dividem o território bloqueiam comboios de ajuda, cobram pedágios e espoliam o pouco que há. A Eritréia expulsou as ONGs, controla toda informação e ajuda que entra no país. A Etiópia gasta quase 15% do se orçamento público no exército que mantém em constante conflito contra Eritréia a quem acusa de apoiar grupos rebeldes. Quênia tem respondido à pressão pública lentamente.

A maioria dos afetados são somalis étnicos, pastores nômades e os muçulmanos: justamente os grupos de marginais, com pouca influência política. Sem poder, sem ajuda é a lei da comunidade internacional.

Os problemas políticos agravaram uma situação climática. A seca no Chifre da África é, provavelmente, a pior em 60 anos. Nas regiões mais afetadas da Somália, os preços dos cereais são 260% maiores do que eram em 2010, comparável ao que aconteceu na Etiópia, quando os preços do grão em atingida pela fome províncias do Norte em meados de 1985 eram cerca de 300% -350% do seu níveis do ano anterior.

A comunidade internacional desistiu de estabilizar a região. Nao existe petróleo, não há ameaça de descontrolados fluxos imigratórios para a Europa. Em resumo, nada lá  realmente importa aos poderosos atores globais. Só há pessoas (milhoes delas crianças) pobres e excluídas em risco. E isto parece não importar. Simple as That.

 

A FAMINE pode ser expressa na equação: [CONFLITO POLÍTICO *(seca + aumento dos preços dos alimentos)]*DESCASO INTERNACIONAL= MORTE. Para reverter o resultado precisamos colocar nesta equação o elemento faltante: VERGONHA. Simple (and sad) as That, again.