terça-feira, 11 de outubro de 2011

DIA DAS CRIANÇAS: SUGESTÃO DE PRESENTE



Amanhã, mais de 5.000.000 de crianças brasileiras passarão do seu dia vivendo em condições de miséria (http://sociometricas.blogspot.com/2011/05/muitos-numeros-um-desafio.html), de extrema pobreza, de situação vulnerável. Chame do que quiser. Não importa o nome. Importa o fato de serem crianças. Responsabilidade de toda a sociedade, segundo está escrito na lei.


É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (Constituição Federal de 1988, o Brasil, o Art. 227)

Um grande presente para elas, seria o cumprimento da lei. Mas, um estudo recente (O BENEFÍCIO INFANTIL UNIVERSAL: UMA PROPOSTA DE UNIFICAÇÃO DO APOIO MONETÁRIO À INFÂNCIA) do Pedro Herculano e do Sergei Soares (IPEA) é mais uma evidência de que esse artigo da Constituição vale menos do que outros.

O estudo, que passo a resumir/editar a seguir, examina o atual arranjo de benefícios monetários para crianças com 15 anos ou menos. No Brasil, estes benefícios são compostos pelo:

1. Benefício variável do Programa Bolsa Família,

2. Salário-família e

3. Dedução para dependente menor de 16 anos no pagamento do Imposto de Renda Pessoa Física.

Os autores analisaram cada um deles sob o ponto de vista do valor, sua cobertura, sua focalização e seu custo fiscal.

A conclusão do estudo é: O sistema atual de benefícios para as crianças é fragmentado, sem coordenação entre benefícios que são parcialmente superpostos, exclui quase um terço das crianças e transfere valores maiores para crianças mais ricas.

Isto é um escândalo, mas a oposição não vai pedir uma CPI, a imprensa não vai noticiar. Porque parece que os problemas mais sérios são o Aeroporto Internacional, o trânsito ou o estádio do Corinthians.

A vulnerabilidade vai além da pobreza (definida como insuficiência de renda). Inclui tudo o que é necessário para o desenvolvimento dos indivíduos (acesso a cuidados e serviços, o respeito aos direitos humanos, a participação cultural, possibilidade de sociabilidade, etc.). Mas, como a renda está correlacionada em algum grau com as outras dimensões e porque é mais fácil de medir, os indicadores de pobreza servem como um espelho (uma Proxy) razoável da vulnerabilidade das crianças em comparação com outras faixas etárias. E, no quesito renda, tanto crianças quanto idosos são os mais vulneráveis porque não possuem (ou não deveriam possuir) renda própria do trabalho e ainda representam um custo adicional ao domicílio (portanto, diluem a renda domiciliar). Mas, no Brasil as políticas sociais até hoje foram muito mais efetivas para os idosos do que para as crianças.

No Brasil, os percentuais de pobreza e extrema pobreza caíram (para qualquer método que for utilizado) para todas as faixas etárias, desde a primeira metade dos anos 2000. Mas, como os gráficos abaixo mostram, apesar dos grandes avanços recentes, a pobreza infantil ainda é consideravelmente mais alta do que a dos demais.





• Em 1995, cerca de 30% das crianças estavam entre os 20% mais pobres. Em 2009, esse percentual já era de 34%.

• Por outro lado, a concentração de crianças no topo da distribuição de renda diminuiu: em 1995, 13% das crianças estavam entre os 20% mais ricos, mas em 2009 eram apenas 10%.

• As crianças representam quase metade (46%) dos extremamente pobres, um grupo cuja renda tende a ser pouco sensível ao crescimento econômico.

Ou seja, não só as crianças estão, desde sempre, mais concentradas entre os mais pobres (que é esperado pelos diferenciais da taxa de fecundidade, pelos arranjos familiares e pelo próprio fato de que a presença de crianças dilui a renda domiciliar), esta concentração tem aumentado ao longo do tempo. O bom momento do mercado de trabalho e o grande sucesso da proteção social brasileira no combate à pobreza entre idosos melhoram significativamente a vida dos adultos. Mas, as crianças foram esquecidas. A POBREZA INFANTIL AUMENTOU!

O estudo ainda lembra um importante fator: a grande volatilidade. Isso significa que um número considerável de famílias entra e sai da pobreza. Como as crianças estão mais concentradas entre os mais pobres, mesmo aquelas que não são pobres ou extremamente pobres correm um risco considerável de se tornar pobres em algum momento ao longo do tempo. Usando os dados do estudo, podemos estimar que quase 1.5 milhão de crianças estejam neste limiar. Noutras palavras, são pobres também.

Benefícios direcionados para crianças seriam essenciais para diminuir a vulnerabilidade deste grupo. Mas, os que existem hoje não cumprem seu papel:

1. Deduções do Imposto de Renda: Têm direito ao benefício, todos que declaram IRPF e têm dependentes menores de 21 anos (ou 24 em caso de estudantes). Mesmo que os dados que a Receita Federal divulgue sejam parciais e desatualizados (sim, o governo não informa ao governo kkk), sabe-se que as deduções com menores de 16 anos devem passar dos R$ 15 Bilhões por ano. Um detalhe, uma estimativa própria aponta que aproximadamente R$ 12 Bilhões por ano são destinados a crianças que vivem entre os 30% das famílias mais ricas.

2. Salário-família (SF): Têm direito ao benefício os trabalhadores formais (exceto os domésticos), alguns trabalhadores avulsos e até aposentados (várias categorias de funcionários públicos recebem um salário-família cujos valores e limites são diferentes daqueles para o setor privado, que não foram analisados no estudo). No setor privado, baseado nos precários dados disponíveis, as empresas declararam um gasto de R$ 1,89 bilhão com o pagamento do SF (em 2007). Mesmo que recentemente tenham sido estabelecidas algumas condicionalidades (vacinação e matrícula na escola), não há sistema que a verifique. Situação curiosa porque existe um sistema nacional de acompanhamento de freqüência à escola para o Bolsa Família, que acompanha quase metade dos alunos do fundamental no Brasil, mas não acompanha as contrapartidas idênticas do SF. Do montante aplicado no SF, além de nenhuma verificação quanto a sua aplicação para as crianças, uma estimativa aponta que apenas 27% estejam em famílias extremamente pobres (lembrando, que o SF é pago aquém tem emprego, registro, etc.).

3. Bolsa-Família: O BF (2003) consolidou, unificou e expandiu a cobertura de diversos programas. Dos 3 benefícios que apóiam as crianças, o BF é o único focado, isto é, é direcionado somente a famílias mais pobres.

    a. O BF conta com dois componentes: um benefício fixo e sem condicionalidades, direcionado para as famílias extremamente pobres, e um benefício variável e com condicionalidades, direcionado para famílias pobres ou extremamente pobres com filhos de ate 15 anos. O benefício variável e pago por criança ate um limite de três benefícios por família.

    b. Em 2007, um novo benefício foi criado, o benefício variável vinculado ao adolescente, pago a famílias pobres ou extremamente pobres com adolescentes de 16 ou 17 anos (até o limite de 2 por família.

    c. A média paga por criança, no Benefício Variável, é de menos do que R$22,00/ mês. Logo, menor do que a dedução máxima efetiva por dependente no IRPF e até mesmo do que o benefício mais elevado do SF.

    d. Vale lembrar, contudo, que há um máximo de três benefícios por família, o que não ocorre nem com o SF nem com a dedução do IRPF com crianças de 16 anos ou menos. Noutras palavras a lei limita os benefícios dos mais pobres e não o faz do restante da população (vide tabela)

Além de deixar um grande número de crianças (inclusive mais pobres) fora do alcance de qualquer benefício e dos valores desiguais, dentre os 3 benefícios, o único focado nas crianças pobres e acompanhado é o BF.




Algumas deduções, que podemos tirar do estudo, todas preocupantes acerca dos benefícios direcionados à Infância:

1. Representam um baixo investimento por criança.

2. Representam um investimento muito inferior ao feito para adultos e idosos.

3. Não são direcionados (em sua maioria) prioritariamente às crianças mais pobres.

Por isto, neste dia da Criança daríamos um grande presente às mais de 5milhoes de crianças brasileiras expostas à extrema pobreza se substituíssemos o atual sistema por um único Benefício Infantil (mesmo universal). Tirar todas estas crianças da extrema pobreza, dar de rpesente o cumprimento do Art.227 custaria o equivalente adicional de 0,2% do PIB (2009). Presente barato.